NAS TRILHAS DO ORAL E DO ESCRITO, A CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO-AUTOR

                                                                                    

                                                                                                      Maria de Lourdes Leandro Almeida

                                                                                                      Doutoranda em Linguística – UFPB

 

1. Introdução

 

      A preocupação com o que acontece quando escrevemos é recente na pesquisa lingüística. Dos anos de 1980 para cá, tem-se ampliado o universo da investigação no domínio da escrita, uma vez que se entendeu que seria o texto o objeto de estudo que traria resposta para as questões até então não resolvidas, quanto à compreensão do funcionamento da linguagem. O entendimento sobre o que fazemos com a linguagem e sobre o que ela faz com o homem em sociedade extrapola, inclusive, o conhecimento do texto, na perspectiva apenas lingüística.

      Neste artigo, discutimos, com base nos pressupostos da Análise do Discurso, os procedimentos do sujeito-enunciador, na construção de sua posição como autor do texto que escreve. Para isso, apresentamos algumas reflexões teóricas sobre a noção de sujeito na linguagem, as noções de autoria e do fenômeno da dispersão. Em seguida, demonstramos em textos escritos por graduandos de Letras que o controle dos mecanismos lingüísticos que o sujeito precisa dominar no texto que escreve é um exercício que lhe dá as condições de se colocar como sujeito do seu dizer. 

 

2. A noção de “sujeito” nos estudos linguísticos

 

      A reflexão sobre a noção de “sujeito”, na pesquisa lingüística, na perspectiva dos estudos clássicos sobre a língua (Platão), não encontra subsídios que destaquem a função “sujeito”, uma vez que língua, nesse contexto, apenas representava o real, idealizava-o. A prioridade dos estudos da língua era o léxico enquanto instrumento para nomear. Sendo a língua considerada como meio de expressão, exterior ao homem, não se cogitava a questão da subjetividade, assim a noção de sujeito não tinha razão de ser.

Com o desenvolvimento dos estudos lingüísticos, na modernidade, principalmente no contexto das vertentes mais avançadas do estruturalismo, surge Benveniste (anos 1960), introduzindo a noção de subjetividade na linguagem, através do estudo dos pronomes.  Concebendo a linguagem como o lugar da constituição da subjetividade, o sujeito (eu) passa a ocupar lugar privilegiado e a língua passa a ser vista como atividade de interlocução.

        Orlandi (1986) e Brandão (1994), analisando a noção de sujeito, distinguem três fases distintas, na evolução desse conceito:

        a) Sujeito centrado no eu, em que a língua é interlocução, a relação é harmoniosa entre o eu e o tu e a língua se institui, se constrói na enunciação. Nesta se instaura a instância discursiva: o eu é o locutor que se enuncia como sujeito, responsável pelo sentido, pela significação, pela subjetividade.

       O eu sujeito, ao se apropriar do discurso, elege o outro do discurso, o tu, e a ele   transcende,  mas um não procede sem o outro, complementam-se. É uma noção de sujeito   regida pelas leis conversacionais, decorrentes do princípio de cooperação griceano,¹ em que o eu é a marca da subjetividade e o tu da não-subjetividade.

        b) O conflito: o eu e o outro. Nessa fase, as relações intersubjetivas são governadas por uma tensão básica em que o tu determina o que o eu diz, ocorrendo uma espécie de tirania do primeiro sobre o segundo. É a concepção presente nos momentos iniciais da Análise do Discurso, focalizando principalmente os discursos políticos. Nessa fase, critica-se a centralização da subjetividade no sujeito, pois afirma-se que ela está na linguagem, mesmo quando não se realiza pelo pronome “eu”.

        c) O sujeito descentrado: o eu e o outro.  Nessa fase, percebe-se que, situando o sujeito no binarismo eutu, polarizando-se essas posições, há o impedimento de se entender o sujeito na sua dispersão, diversidade. O sujeito não é mais visto como a única fonte e origem do sentido, porque na sua fala outras vozes também falam. A subjetividade não se centra mais no eu nem no tu, mas na relação eu versus tu dentro do contexto histórico, sócio-ideológico, isto é, no espaço discursivo criado entre ambos. O sujeito só se completa na interação com o outro.

 

 

 

 

 

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¹ Segundo H. P. Grice (1975), o princípio básico que rege a comunicação humana é o Princípio da Cooperação. Isto é, quando duas ou mais pessoas se propõem a interagir verbalmente, normalmente irão cooperar para que a interlocução transcorra de maneira adequada. Esse princípio envolve quatro máximas: Máxima da Quantidade, da Qualidade, da Relevância, do Modo.

3. Letramento, sujeito do discurso, autoria                                                                                                                                                         

 

     Segundo Tfouni (2002), Letramento é um fenômeno de natureza social que se              caracteriza por ser um processo de apropriação do sistema de escrita que ocorre em sociedades que a utilizam para o desenvolvimento de suas atividades diárias.  O letramento influencia direta ou indiretamente culturas e indivíduos que dominem ou não a escrita. Basta estar exposto a um ambiente/sociedade que se utilize da mesma. Letramento é um processo mais amplo que a alfabetização. No entanto, o letramento é completamente relacionado com a existência e influência de um código escrito.

        Segundo a referida autora, na perspectiva ideológica, o letramento tem como noção-eixo a de autoria do discurso a qual se constrói, se realiza tanto no discurso oral como no escrito: há características orais no discurso escrito bem como traços de escrita no discurso oral.

       Tem-se, então, como parâmetro não mais a língua mas os discursos que servem de suporte às práticas letradas. Desse modo, o ponto de partida teórico-metodológico muda de foco: ao invés de se partir do indivíduo que usa a língua escrita, parte-se da posição de sujeito dentro do continuum do letramento.

        Segundo Tfouni (2001), na perspectiva da Análise de Discurso francesa, autor é diferente de escritor e de narrador. Autor é uma posição discursiva. Tem a ver com a noção de sujeito do discurso. Ambos se completam, aquele trabalha com o intradiscurso (discurso interior, particular), este trabalha com o interdiscurso (discursos alheios, os outros discursos). Nesse sentido,

 

      o autor é uma posição do sujeito a partir da qual ele consegue                                                                                                         estruturar seu discurso (oral ou escrito) de acordo com um princípio organizador contraditório, porém necessário, pois no processo de produção de um texto, um movimento de deriva e dispersão de sentidos é inevitável, o qual o autor precisa ‘controlar’, a fim de dar ao seu discurso uma unidade aparente, com começo, meio e ‘fechamento’... (p.83 )

 

       Nessa perspectiva, o sujeito do discurso constrói, revela sua autoria, quando, na mediação, entre seu discurso próprio e os dos outros de que precisa (os interdiscursos) desvela, descobre um estilo próprio, um modo de ser e de dizer que o particulariza, acrescentando, pelo “novo” modo de dizer o já dito que emerge do seu dizer naquelas circunstâncias.

       O sujeito lida com a dupla ilusão: de ser a origem do seu dizer e também de  pretender que o que diz (escreve) seja a tradução literal de seu pensamento. O autor tece o fio do discurso procurando construir para o leitor/ouvinte a ilusão de um produto linear, coerente e coeso que tem começo, meio e fim. É o fenômeno da contradição, conseqüência da relação autor e  sujeito do discurso.

      Segundo Pêcheux, (apud Tfouni, op.cit.), o trabalho de autoria situa-se na divisão discursiva entre dois espaços: o da manipulação de significações estabilizadas e normatizadas e o das transformações de sentido: interpretações.

       O sujeito ocupa a posição de autor quando controla esse movimento de produção de sentidos, procurando “amarrar” a dispersão (que está sempre virtualmente se instalando, devido à equivocidade da língua). O sujeito, então, consegue olhar para o seu texto de um outro lugar, o lugar de autor (espécie de onipotência que se apodera do autor).

       Para isso, deve estar sempre tomando decisões no sentido de eleger formas, descartar outras (por serem “inadequadas”), no nível paradigmático do sistema lingüístico, reelaborar modos de dizer, alterar outros, procurando, assim, controlar a dispersão. Às vezes, a ilusão de que pode dizer tudo e assim o consegue apresenta-se apoiada em outro fator, como salienta Tfouni (op.cit.). Segundo ela, a idéia de poder dos que dominam a escrita é o conhecimento de um “saber metalingüístico” que se caracteriza por meio do uso de “instrumentos lingüísticos”, através das gramáticas e dicionários. Esses instrumentos passam a noção de que determinam a “prática lingüística real”.

 

4. O contexto da obtenção dos dados

 

      Os dados objeto de análise do presente estudo foram coletados durante o desenvolvimento da disciplina Prática Pedagógica II, componente curricular do curso de Letras, habilitação em Língua Portuguesa. No decorrer das atividades didático-pedagógicas, introduzimos a prática da escrita de textos acadêmicos, exercitando o resumo e o relato escrito. Cada uma dessas produções originou-se de condições diferentes: o resumo, para registrar os principais tópicos de textos teóricos estudados pela turma; o relato, para registrar as informações colhidas através da exposição oral de um desses textos teóricos estudados.

      O resumo era produzido extra-classe  e o relato escrito era produzido em sala de aula, após a exposição oral do texto teórico em estudo. À medida que os alunos elaboravam seus textos, estes eram corrigidos pelo professor e, sob sua orientação, eram reescritos, para que as referidas produções atendessem à adequação de conteúdo e forma dos referidos gêneros textuais acadêmicos. 

      Durante o exercício de releitura, foi possível caracterizar os procedimentos lingüísticos que os alunos-escritores utilizavam para estruturar seus textos. Em duas das produções de um dos referidos alunos, destacamos o uso da coesão referencial, no plano lexical, relativo às formas remissivas referenciais, segundo Koch (1989).  Este mecanisamo chamou-nos a atenção, devido ao tratamento bastante “estranho”, dado pelo informante a esse uso, considerando-se o gênero escrito em que ocorria. Vislumbramos nesse movimento um exercício de tentativa de se colocar na posição-sujeito, garantia de se instituir a autoria do texto escrito.

     Para efeito de análise, no primeiro momento, destacamos um resumo do artigo “Textos: Seleção Variada e Atual” de Bezerra (2001).Esse artigo trata da análise da proposta de seleção de textos presentes nos livros didáticos de português. Desse resumo, analisamos um trecho de uma primeira reescritura, comparando-o com o mesmo trecho da versão original. No decorrer da análise, citamos também o mesmo trecho, tratado numa segunda reescritura.

        No segundo momento dessa análise, destacamos um relato escrito, originado de uma exposição oral acadêmica que trata das propostas de compreensão de texto, nos LDP, assunto abordado por Marcuschi (In: Bezerra e Dionísio, 2001). Desse relato, analisamos dois trechos da versão original.   

 

5. A coesão e as marcas de autoria no fenômeno da dispersão                                                           

 

      Destacando o processo da coesão referencial, quanto ao emprego de formas remissivas referenciais, procuramos entender as questões de seu emprego, sem aprofundar numa visão estritamente textual. Analisamos esse recurso, considerando-o como um aspecto da autoria, na perspectiva do letramento como processo sócio-histórico e sua relação com o uso da escrita em situação escolar. Essa elaboração parece estar influenciada pelo interlocutor a que se destina.

 

     5.1. No contexto do resumo

 

(1)

 

      “Já nos anos 70, os LDP passaram a inserir, ao lado dos textos literários, textos também não-literários. Apesar deste avanço, um fator negativo era evidente: as perguntas exigiam respostas de caráter monossêmico. E, além disso, priorizava por demais os elementos de comunicação, os quais eram necessários para que um texto fosse texto. Nota-se aí, uma preocupação com a estrutura do texto, olvidando outros  aspectos relevantes.” ( resumo – primeira reescritura)

 

(2)

 

                                          [...] Nota-se aí, uma preocupação com a estrutura do texto, deixando outros aspectos relevantes de lado. ( resumo – versão original)

 

      Tomando como referência a versão original, constatamos que, nesta, o termo usado para a primeira situação evidenciada com o nome “olvidando” era [...] deixando outros aspectos relevantes de lado. A substituição realizada pelo informante, através de uma forma remissiva referencial, chama atenção, uma vez que esse procedimento não era uma exigência para esclarecimento do sentido, quanto à referência à que o termo “deixando” realizava. Este referia-se à abordagem que apresenta os LDP dos anos de 1970 na compreensão do texto: esta destacava  elementos da estrutura do texto em estudo, deixando de abordar outros aspectos importantes para trabalhar essa  compreensão .

      O uso do termo olvidando é, no mínimo, “estranha” a esse tipo de texto. Não se trata de texto literário, cujo contexto permite o uso de termos rebuscados, dicionarizados. Percebemos, assim, a tentativa de se fazer presente o sujeito-autor numa construção textual em que as vozes mais fortes são representadas pelo texto estudado, pois trata-se de reproduzir informações teóricas.   É o movimento da luta com as palavras que requer o domínio do intradiscurso, isto é, o autor tenta impor o seu discurso em confronto com o interdiscurso, com que está lidando Não é  bem sucedido, porque o sujeito-autor precisaria controlar esse dado de dispersão, se utilizasse termo adequado à natureza do texto em questão: texto teórico analítico-crítico.

      No segundo exercício de reescritura, o sujeito-informante substitui olvidando por-menoscabando.

 

(3)                       

 

                                          [...] Nota-se aí,uma preocupação predominante com a estrutura do texto, menoscabando outros aspectos relevantes. (resumo – segunda reescritura)

 

Em meio a outros aspectos problemáticos que contém a estruturação interna desse referido texto, como ausência de concordância verbal (... E além disso, priorizava (m)...), trecho 1, por exemplo, para se referir aos livros didáticos,  o informante se volta unicamente para a preocupação com o vocabulário, como recurso para impressionar. Assim, apresenta dificuldades visíveis de interagir com esse gênero textual, não controlando as dispersões, no contexto do sistema de referência, por exemplo, no ato de escrever, como a adequação de sua linguagem à linguagem própria para esse tipo de registro Atém-se o sujeito-informante à tentativa de inscrever-se nesse discurso (discurso dos outros) às custas de se fazer presente ao tentar impressionar pela aparência de um domínio de vocabulário excêntrico ao contexto em que este se inscreve.

  

   5.2. No contexto do relato escrito

         

      Na produção do relato escrito, como exercício de escrita acadêmica, o sujeito-informante depara-se com um gênero textual híbrido: inscreve-se no continuum entre o oral e o escrito, uma vez que possui características das duas modalidades. Do oral, traz as marcas das condições de produção da situação comunicativa oral, próprias da exposição de conteúdo teórico. Do texto escrito, o relato deve recuperar essas condições para poder contextualizar as informações veiculadas na referida exposição, considerando, por sua vez, as adequações do conteúdo aos limites e formalidade do texto escrito, exigido no espaço escolar.

      Esses aspectos das condições de produção parecem ter dificultado ainda mais o sujeito-informante, quanto às suas decisões no controle do fenômeno da dispersão, ao tentar dominar a sistematicidade da língua, nas duas modalidades.

 

(4)

 

      “Na apresentação, tratou-se a questão da compreensão de texto nos LDP refletida por Antônio Carlos Marcuschi o qual em um 1º momento, após ter analisado vários LDs, defende a tese de que os LDP priorizam a execução de compreensão de forma caótica, mas afirma também que o LD apesar de suas evidentes falhas ainda continuará sendo importante no ensino, desde que dele seja feito recurso e não a única ferramenta de trabalho no ensino-aprendizagem.” (relato escrito – versão original)

 

      Percebemos em (4) uma série de usos inadequados na estruturação das informações, devido ao emprego dos termos destacados. Insistimos então em destacar a necessidade do referido informante de inscrever seu discurso, a ponto de não perceber que os termos em evidência não se adéquam à informação a que remetem: refletida parece valer por “analisada”, a execução parece valer por “uma abordagem”, a construção dele seja feito recurso parece valer por “desde que seja utilizado como recurso”, além do uso da expressão de forma caótica para se referir, talvez, ao que o autor da análise trata como “falta de critério”.

      Nessa mesma linha de raciocínio, temos em (5) um exemplo do gosto no uso de termos excêntricos ao contexto.

 

(5)

 

                                               “E no último momento foi esclarecido que os problemas nesse tipo de atividade são causados pela errônea compreensão de texto como decodificação, e que essa falha será subvertida quando a compreensão textual for vista como um processo[...]” (relato escrito – versão original)

 

      É o caso do termo subvertida que não representa adequadamente o sentido a que remete. Essa palavra, entre muitos dos seus sentidos, pode significar “destruída, derrubada, arruinada, afundada...”, logo nenhum que corresponda ao que o contexto exige. Neste, uma das possibilidades poderia ser o termo “superada”. 

      A dificuldade de tratar a dispersão caracteriza-se, nesses exemplos, como desconhecimento para lidar com a seleção lexical das formas remissivas referenciais que, segundo Koch (op.cit.), não só realizam instruções de conexão do sentido mas também acrescentam  categorizações do sentido a que remetem.  Assim, parece-nos que o sujeito-informante representa a contradição no tecer as relações das idéias no texto que escreve: a procura pela melhor forma e a luta com o pouco domínio do fenômeno da  dispersão, o que é exatamente a chave para entender esse processo e assim fazer-se sujeito-autor do que escreve.  

 

6. Algumas considerações finais

 

      Considerando que temos analisado a prática da escrita acadêmica no continuum oral/escrito, uma vez que a situamos no contexto do letramento como processo sócio-histórico, destacamos que o grau de compreensão acerca do fenômeno da dispersão com que se depara o escritor depende do conhecimento que este tem da língua escrita e da vivência desta em situações reais de uso.

      O sujeito-informante de nossa pesquisa demonstra o esforço que faz para se inscrever na posição-sujeito dos textos que escreve. No entanto, essa luta ainda está marcada pela inexperiência e desconhecimento que revela ao lidar com o fenômeno da dispersão em textos que exigem elaborações mais formais, devido aos objetivos a que atendem. A ocorrência de termos “estranhos” ao gênero de texto escrito em que ocorrem, numa tentativa de se marcar a presença do sujeito-autor, provoca estranhamento, devido às inadequações de sentido e forma que ocorrem na estruturação interna dos textos. Esses efeitos são tão visíveis que nos levam a acreditar no fato de que essas decisões caracterizam a ilusão que se apodera do sujeito escritor de que sabe/pode tudo com a linguagem. Respaldamos essa interpretação em pontos de vista apresentados pelo sujeito-informante em uma entrevista dada, quando ele afirma o seguinte:

 

   [...] Quando escrevo, tenho o propósito de despertar a curiosidade de alguém [...]; [...] A seleção vocabular que utilizo vai depender para quem vou escrever [...]; [...] Por isso, que ao produzir textos tenho sempre um dicionário ao lado. [...] E, como gosto de escrever para professores e estudantes, procuro impressionar também com vocábulos ‘desconhecidos’. (S. F. M.)

 

      Na verdade, os termos “estranhos” que o autor chama de “vocábulos desconhecidos”, são questionados, não por serem “desconhecidos”, mas por não se adequarem ao contexto onde se inscrevem. É o “saber” corporificado na forma de “instrumentos lingüísticos” (dicionários). No caso específico, esses usos têm sido motivo de uma noção confusa do controle desse processo, o que descaracteriza a construção da posição sujeito-autor, responsável pela unidade do texto.

    Podemos considerar, nesse caso, que o sujeito-informante, tendo como interlocutores o professor e estudantes, precisa demonstrar que também “sabe” ser “formal”. É sua luta para garantir sua participação mais efetiva, nessa prática especificamente acadêmica. É preciso, por outro lado, destacar a função da escola: garantir essa condição, tornando real o exercício da escrita de textos que atendam a graus de formalidade, dos menos complexos aos mais complexos, gerando condições adequadas para a construção pelo aluno da posição de sujeito-autor do que diz e escreve.

 

7. Referências

 

BRANDÃO, Helena H.N. Introdução à Análise do Discurso. Campinas, SP: Editora da UNICAMP ,1994.

 

GRICE, H. P. Logic and conversation. In: COLE, P & J.L. MORGAN (eds.)  Syntax and Semantics, v.8, Nova York, Academic Press, 1975: 41-48

 

KOCH, I. V. A Coesão Textual. São Paulo: Contexto, 1989. (Repensando a língua portuguesa).

 

ORLANDI, ENI P. Discurso e Leitura . 6ed. São Paulo, Cortez; Campinas, SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2001 (Coleção passando a limpo)

 

_____ A análise do discurso, algumas observações. In: Delta, vol. 2, nº 1, 1986.

   

TFOUNI, Leda V. Letramento e Alfabetização. 5ed. São Paulo, Cortez, 2002 – (Coleção Questões da nossa Época; v .47)

 

_________________ A dispersão e a deriva na constituição da autoria e suas implicações para uma teoria do letramento. In: SIGNORINI, Inês (org.) Investigando a relação oral / escrito e as teorias do letramento. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2001.- (Coleção Idéias sobre a Linguagem).

 

Fragmento do resumo do texto “Seleção Variada e Atual” (Bezerra, 2001)

 

   Apesar de o LDP ser concebido como fonte única de ensino-aprendizagem, no qual a figura do professor é estigmatizada a um mero “porta-voz” presente, é preciso admitir que houve uma melhoria considerada a seu respeito, tanto por conseqüências de instâncias governamentais quanto por parte das ciências lingüísticas e de professores insatisfeitos com o que até então vinha sendo apresentado.

   Antes disso, os problemas se mostravam pela confusão no tocante à concepção de texto subjacente ao LDP, o qual era concebido ou como unidade gramatical (atendendo a necessidades artificiais avaliativas); ou como dialógico, inserindo todos os critérios que envolvem uma produção textual.

   Nos anos 60, os LDP priorizavam textos literários, forçando o aluno a usar a criatividade, o dom, a inspiração para produzir textos, imitando assim os modelos dos grandes escritores.

   Já nos anos 70 os LDP passaram a inserir ao lado dos textos literários textos também não-literários. Apesar deste avanço, um fator negativo era evidente: as perguntas exigiam respostas de caráter monossêmico. E, além disso, priorizava a demais os elementos de comunicação, os quais eram necessários para que um texto fosse texto. Nota-se aí, uma preocupação com a estrutura do texto, deixando outros aspectos relevantes de lado.

   Um outro problema é quanto ao tratamento dos gêneros e tipos textuais. Nos LDP, é trabalhado prioritariamente a tipologia textual: narração, descrição e dissertação, os quais não atendem às necessidades reais de uso em uma sociedade letrada.Vale ressaltar que a seqüência textual: narração – descrição – argumentação remete a conclusão de que narrar é mais fácil do que descrever que por sua vez é mais fácil do argumentar.[...]

 

Fragmento do relato do texto “Compreensão de texto: Algumas Reflexões”, (Marcuschi, 2001)

 

   Este relato refere-se a uma apresentação oral em sala de aula de um grupo do II ano de Letras, destinado ao componente curricular Prática Pedagógica II, fundamentada no III capítulo do livro “O livro didático de português” das organizadoras Ângela Paiva Dionísio e Maria Auxiliadora Bezerra.

   Na apresentação tratou-se a questão da compreensão de texto nos LDP refletida por Antônio Carlos Marcuschi  o qual em um 1º momento, após ter analisado vários LDs, defende a tese de que os LDP priorizam a execução de compreensão  de forma caótica, mas afirma também que o LDP apesar de suas evidentes falhas, ainda continuará sendo importante no ensino, desde que dele seja feito  recurso e não   a única ferramenta de trabalho no ensino-aprendizagem.[...]