O AMBIENTE DE EAD E O ENSINO DA PRODUÇÃO DE TEXTO

 

Odiombar Rodrigues

ULBRA/Canoas

 

 

Aprender a escrever significa adquirir gradativamente algumas habilidades, do mesmo modo que se aprende a andar de bicicleta. (SERAFINI: 1991, p. 20)

 

 

A produção de texto tem sido a preocupação constante dos professores, especialmente no Ensino Médio, em contrapartida, os alunos têm demonstrado um desinteresse muito grande pelo ato paciente de escrever. Não se pode dizer que os alunos estejam desligados da comunicação com a sociedade, o que acontece é que a escola, cada vez mais vem se distanciado das necessidades comunicativas do aluno e de suas habilidades.

Os meios eletrônicos têm merecido, por parte dos adolescentes, uma atenção quase exclusiva. O computador é o elo de ligação deles com o mundo. O que acontece na tela do computador é assunto e merece atenção. Usando a metáfora de Toffler (1980), devemos reconhecer que vivenciamos a “terceira onda” e, por isso, estamos no meio de um turbilhão de inovações tecnológicas que mal podemos perceber. A rapidez com que esta “terceira onda” avança, torna-nos partícipes de mundos diferentes, e mesmo conflitantes. As crianças que nos cercam já estão sendo “alfabetizadas” num mundo tecnológico no qual muitas vezes amargamos o be-abá, mal soletrado.

Este fenômeno é recente e difícil de ser compreendido por gerações mais velhas. Como que o “netinho” pode “ensinar” à vovó assuntos tão importantes como administrar a conta bancária via Internet? Estes fatos com os quais já estamos nos acostumando, no nosso convívio familiar, também se manifestam no ambiente escolar, como vemos no texto abaixo.

O paradoxo educacional é a supremacia do corpo discente sobre o docente no que se refere ao manejo das novas tecnologias. (BRAGA e PINHO: 2005, p.1).

A escola não pode se restringir ao domínio do livro e da lógica linear, deixando de lado o avanço contemporâneo que prioriza a imagem e a fragmentação da informação e do conhecimento. Cabe à escola olhar para o futuro, pois a velocidade das conquistas tecnológicas é tão grande que já vivemos numa sensação  de falta de “presente”. Como observa Joan Ferrés:

“Em uma sociedade que se transforma vertiginosamente, o objetivo da educação não deveria centrar-se no presente. Em seus objetivos, em seus métodos de ensino a escola continua ancorada no passado”. (FERRÉS: l996, p.9).

O esforço de nossa pesquisa é incorporar a tecnologia disponível às ações metodológicas para a  produção de texto. O presente trabalho é uma versão, ainda em processo, sobre uma pesquisa mais ampla que se desenvolve com o objetivo de trazer para a prática docente os avanços tecnológicos disponíveis, bem como captar a atenção do aluno, induzindo-o a produzir textos de forma espontânea e eficiente.

Dentro da disciplina de Produção Textual, foi proposto aos acadêmicos um estudo que examinasse e analisasse os cursos de redação que são oferecidos via Internet. Após um levantamento exaustivo que catalogou os conteúdos oferecidos, as oportunidades de prática e as formas de acompanhamento, foi redigida a presente proposta que se encontra em fase de testes.

Os acadêmicos realizaram as atividades de pesquisa como atividades extraclasse e, posteriormente, desenvolveram seus projetos em escolas da rede pública da região de Canoas. Todo o trabalho de intervenção na escola foi acompanhado pelos coordenadores pedagógicos das escolas, cabendo ao professor da disciplina de Produção Textual a tarefa de avaliação de cada projeto aplicado.

Dividimos o nosso trabalho em duas partes. A primeira dedica-se ao exame de fundamentação teórica; a segunda centra-se numa proposta, ainda que genérica, aplicável a turmas de Ensino Médio, em escola razoavelmente equipada com recursos de informática.

A tecnologia disponível não tem tido o emprego adequado no sistema de ensino, são recursos que se desperdiçam pela falta de utilização, ou uso deficiente tanto em razão da carência dos meios tecnológicos, no âmbito escolar, como pela falta de aceitação e/ou conhecimento por parte dos agentes da educação. Mesmo nas escolas em que há computadores e linha de Internet disponível, o uso não tem ultrapassado o nível da pesquisa esporádica ou da navegação aleatória.

Grande parte das escolas que disponibiliza computadores possibilita aos alunos um treinamento de familiarização com a máquina, mas não desenvolve projetos educacionais que, utilizando recursos de informática, empreguem-nos em atividades sistemáticas e incorporadas à metodologia de sala de aula. O ensino tradicional está centrado, quase exclusivamente, no código lingüístico, enquanto que o EAD participa da pluralidade de códigos presentes na Internet.

Temos, também, a intenção de subsidiar as escolas interessadas em implantar uma metodologia informatizada para a produção de texto. O que se propõe não é a solução do problema, mas uma oferta de alternativa para a sala de aula.

Duas situações se apresentam como alternativas: a primeira que circunscreve o uso do computador ao recinto da escola, e a outra que estabelece uma interação entre o estudo em sala de aula e o extraclasse.  Essas duas alternativas não são excludentes e podem ser conciliadas em uma intermediária que permita liberdade de atuação ao aluno e dinamicidade ao professor. Esta é a pretensão de nossa proposta.

Os alunos de escolas de classe média e alta estão, tecnologicamente, em seus lares, muito além da vivência que a escola lhes propicia. O ambiente escolar fica muito aquém da experiência cotidiana deles. O descompasso entre o avanço tecnológico e a prática docente é cada dia mais flagrante. As pesquisadoras Clarissa Braga e Lídia Pinto conceituam o problema nos seguintes termos:

(...) a maioria das escolas do primeiro e segundo graus que tentam introduzir as novas tecnologias no currículo escolar, apenas o fazem como mais uma ferramenta a serviço dos antigos métodos de ensino.  (BRAGA e PINHO: 2005)

O que se vê, quanto ao uso do computador em sala de aula, é uma tentativa de subordiná-lo a antiquados métodos de ensino, não usufruindo o potencial que o computador tem. A escola mantém seus métodos remanescentes da “segunda onda” e tenta incorporar a tecnologia contemporânea à sua rotina. Não se observa por parte da escola, um esforço para acompanhar as mudanças, mas apenas para adaptar a sua prática às inovações.

Outro fator deve ser examinado antes de prosseguirmos na nossa discussão sobre o uso do computador. A alfabetização digital não está alienada da alfabetização tradicional da escrita. Impossível imaginar a tecnologia como uma panacéia superadora das deficiências da aprendizagem. Incluir o aluno no mundo digital pressupõe uma competência mínima no mundo da leitura e da escrita. O que falamos agora não é da simples alfabetização, como aquisição de letras, mas da  alfabetização como inclusão do aluno num mundo mais amplo. Parece que aqui se ajusta o já conhecido aforismo de Paulo Freire: “Ler é ler o mundo”.

 Num primeiro momento pode parecer, a alguns, que a precariedade da rede de ensino é tão grande que não vale a pena investir na tecnologia, pois isto viria a atender a uma pequena parcela da sociedade. Mesmo que possa parecer um número reduzido de alunos nestas circunstâncias, é importante que se desenvolvam metodologias que os atendam, pois a tendência é que tal grupo se amplie em tempo bem próximo.O avanço tecnológico não espera por retardatários, por isso o argumento de que grande parte ainda não está incluído kno mundo digital é falacioso, ou ideológico, pois cada vez mais se amplia o abismo entre classe sociais. Cumpre ao Estado oferecer educação de qualidade, sintonizada com as inovações, pois do contrário, cada vez mais vai permitir que as classes favorecidas tomem a dianteira na progressão dos estudos e no mercado de trabalho.

Quando olhamos o passado e percebemos que o computador e a Internet são parceiros recentes, ainda jovens em experiências e repletos de segredos que desafiam a nossa curiosidade, damo-nos conta de que ainda estamos longe de usufruirmos todas as suas potencialidades. Surge a necessidade de desenvolvermos projetos que coloquem em uso estes recursos não só com expectativa de certeza de resultados, mas também como laboratório de aprendizagem.

Nesta direção, é que propomos o exame dos papéis do professor e dos alunos, dentro desta nova realidade, bem como a reflexão sobre as metodologias aplicáveis ao ensino da produção de texto. A nova realidade do papel do aluno nos leva a perceber a necessidade de encararmos a motivação como fator central num projeto que se destina a implementar o Ensino a Distância (EAD).

Clarissa Braga e Lídia Pinto conceituam os métodos educacionais como modernos e centrados em tecnologias contemporâneas. Para as autoras, moderno significa subordinado ao racionalismo, ao tempo, ao espaço e ao conhecimento escrito. As novas tecnologias rompem com o racionalismo linear, gradual e centrado em causas e conseqüências. As dimensões de tempo e espaço também se alteram no mundo informatizado e o texto não preenche mais um espaço físico, mas se realiza de forma virtual na tela do computador.

Com todos estes parâmetros, é mister que a escola que pretenda se incluir no mundo informatizado volte-se para uma reflexão profunda sobre seus métodos e práticas docentes, pois, com certeza, não temos como conciliar dois mundos tão díspares. Cabe à escola criar este espaço lúdico (virtual) que seduz o aluno para o campo da formação pessoal, pois a sua adesão ao mundo da informática já ocorreu de forma voluntária.

É importante que a escola aproveite esta aceitabilidade do aluno em relação aos meios eletrônicos para canalizar esta energia em direção à aquisição do conhecimento. Para tal propósito, é indispensável que a escola se renove por completo em termos metodológicos.

Aquilo a que nos referimos aqui é a uma metodologia que privilegie a prática da leitura e da escrita através do meio eletrônico, substituindo o ensino centrado na transmissão oral, o que resulta numa nova concepção de educação e de educador. O desenvolvimento de uma metodologia de produção de texto utilizando ferramentas de comunicação, através da Internet, é uma tarefa que exige compreensão diferenciada tanto do papel do aluno, quanto do professor (tutor)

O aluno deixa de ser o receptor das aulas e passa a ser o agente promotor do conhecimento, pois a ausência física do professor em suas atividades extraclasse, exige dele uma deliberação pessoal para se manter ligado às atividades propostas. O professor, transformado em tutor, investe menos tempo no atendimento de particularidade e concentra todo seu esforço na produção de experiência para o ambiente de aprendizagem.

Assim como se prevê uma nova dimensão para professores e alunos, é importante também se discutir o rompimento dos limites do espaço da sala de aula. Esta está centrada na relação direta professor/aluno. Numa primeira vista, a nossa apresenta-se como um distanciamento entre os atores do processo ensino/aprendizagem, porém com o transcorrer do trabalho, percebe-se que este distanciamento é apenas uma questão física, pois alunos e tutores dispõem de recursos eficientes e simples para estabelecer uma relação dialógica que promove a discussão e, conseqüentemente, a eficiência da aprendizagem.

Os recursos eletrônicos disponibilizam uma nova concepção das dimensões de tempo e espaço. Alunos e tutores vivenciam espaços diversos e, de forma assíncrona, vivenciam, em tempos diversos, mas comuns, as suas experiências educacionais.

Quando o aluno acessa a Internet, ele está num espaço eletrônico que é comum a ele e ao tutor, embora a espacialidade existencial seja diferenciada. A rede de Internet se transforma num espaço-tempo virtual[1], partilhado por muitos, é como se o tempo previsto (vivenciado) pelo tutor se repetisse para ambos a cada acesso à Internet. Da mesma forma como já estamos acostumados a conviver com “empresas virtuais” que, apesar de sua eficiência e dinamicidade, encontram-se distantes de nosso mundo físico, a escola também pode virtualizar-se sem que com isto perca em eficiência.

A sala de aula tradicional tem uma dimensão espacial definida e uma temporalidade limitada. Uma vez transcorrido o tempo, a aula se esgota e não há mais como repeti-la. No meio eletrônico a aula está acima da dimensão temporal, podendo se realizar a cada acesso. A aula está num espaço/tempo fora do real, porém passível de atualização a cada acesso. Este rompimento com o “ser-aí” (dasein em Heidgger) é que constitui a principal caracterização do mundo da Informática. Mesmo não estando dimensionado num limite espaço/temporal, a aula é disponível a cada momento, isto é, ela é uma presença virtual. Importa também se dar conta de que a virtualização é, ao mesmo tempo, um êxodo, pois aquilo que temos presente em um momento, temo-lo como ausência total quando não virtualizado.

O fenômeno da virtualização é muito importante de ser entendido em termos de educação. Na escola tradicional, o aluno tem elementos referenciais presentes a cada momento quer seja o prédio físico da escola, como espaço do saber, quer seja o material escolar (livros, cadernos...) que o acompanham e fazem parte de seu mundo da aprendizagem. No computador, quando se desliga o aparelho, ou mesmo troca-se de “site”, nada mais resta.

É importante perceber que tanto o tutor como o aluno desempenham suas funções com ritmo próprio,  na sala de aula tradicional, os dois estão numa relação dialógica instantânea. No EAD, cada um desenvolve seu turno na comunicação de forma independente, num tempo descontínuo. Embora não reunidos fisicamente, os parceiros de aprendizagem podem formar comunidades que se mantenham unidas através de afinidades pessoais.

A ponte que estabelece a ligação entre aluno e tutor é a plataforma de que dispõem para intercâmbio de informações. Esta pode ser mais ou menos sofisticada, mas, mesmo as mais simples, são capazes de disponibilizar recursos suficientes para uma comunicação eficiente entre as partes. Não são os recursos sofisticados que dão eficiência ao sistema, mas a dinamicidade empregada pelo tutor e pelo aluno que torna o meio eletrônico um instrumento válido neste processo de ensino/aprendizagem.

Quando os recursos de uma plataforma são eficientes e a comunidade é estimulada a utilizá-los, surge uma forte interação entre os componentes do grupo, o que torna o aprendizado uma atitude solidária. Cada aluno se sente responsável pelo  seu aprendizado, mas, também, responsável pelo progresso dos demais, como diz Lévy: Apesar de “não presente”, essa comunidade está repleta de paixões e de projetos, de conflitos e de amizades. (LÉVY: l996, p. 20).

Cada membro da comunidade se torna atuante e participativo, na medida em que se vê frente a situações provocadoras nas propostas feitas pelo tutor. É neste contexto que se deve apostar na produção de texto como um vínculo de comunicação entre os participantes do grupo. Produzir textos, em suas diversas tipologias, passa a se constituir num ato de comunicação entre os componentes do grupo, e, assim, a produção de texto deixa de ser uma atividade sem destinatário para se tornar um instrumento de comunicação. Como fatores de motivação para a aprendizagem, o tutor deve dedicar seu esforço no sentido de propiciar: a) formas de apropriação do conteúdo; b) projetos de avaliação personalizados; c) relações significativas entre conteúdo e vivência dos alunos; d) propostas de reflexão; e) interação da comunidade.

Para a elaboração de uma metodologia é fundamental que se estabeleça alguma reflexão diante do conceito de aprendizagem em ambiente de EAD que se constitui numa apropriação do conhecimento de forma livre e motivada, portanto a aprendizagem é o resultado de um processo que se inicia pela motivação. O ambiente de EAD é plenamente favorável ao processo de motivação, pois o aluno, quando entra no ambiente de aprendizagem, o faz de forma livre e, provavelmente, ele está receptivo às propostas apresentadas.

Nesta atitude reside o ponto central para a motivação. A entrada do aluno deve se dar através de atividades críticas e desafiadoras que o encorajem, de imediato, a uma atitude de reflexão e tomada de posição.

De forma geral, a motivação ocorre através de estímulos a determinadas atitudes. O aluno se motiva quando vê reforçada a sua auto-estima, quando percebe crescimento pessoal, quando desperta para a ação e quando se torna curioso. Cabe ao tutor prover atividades que estimulem nos alunos as atitudes enumeradas acima. No EAD o professor nunca consegue apenas ofertar o conteúdo, ele é responsável pela proposta de atividades que estimulem a coesão do grupo, a capacidade de cada um e a motivação num nível muito alto.

Como fatores de motivação para a aprendizagem o tutor deve dedicar seu esforço no sentido de providenciar a execução e controle de alguns elementos que são fundamentais para o sucesso do ensino em ambiente eletrônico. O exame de cada um destes fatores pode levar a uma proposta metodológica diferenciada para o ambiente de EAD.

a) Formas de apropriação dos conteúdos. - Através de um hipertexto inicial o tutor pode direcionar a atenção do aluno para as necessidades teóricas implicadas na construção do texto. Não vale a teoria como reserva abstrata de conhecimentos, mas como ferramenta indispensável para a produção de texto coeso e coerente. O conteúdo teórico deve estar disponível através de textos claros, simples e aplicados às situações semelhantes a outras comuns para o aluno.

b) Projetos de avaliação personalizados - No ambiente de EAD a avaliação não pode ser apenas uma aferição de resultados, mas deve constituir-se num instrumento de contínua verificação de progressos e carências.

c) Estabelecimento de relações significativas entre conteúdo e vivência. Qualquer projeto educacional só terá sucesso quando estabelecer vínculos entre o que se aprende e o que se vivencia. Todas as propostas de atividades devem estar tão flexíveis que possibilitem ao aluno adequá-las às suas necessidades. A melhor forma de ele perceber a sua progressão é constatar a satisfação de suas necessidades.

d) Proposta de reflexão - Se toda a progressão educacional está centrada na formação do sujeito quer como consciência de si, quer como consciência do mundo e suas relações, é certo que este processo depende da reflexão. O ensino da leitura e da produção de textos constitui-se num dos campos do saber mais propícios para a execução deste objetivo tanto pelo fornecimento de leituras, como pelo processo de passagem do pensamento para a escrita.

e) Interação da comunidade -  Este é um dos fatores motivadores que tem sua responsabilidade repartida entre todos os membros da comunidade. Cabe ao tutor disponibilizar ações que propiciem a interação, principalmente estimulando metodologias que utilizem a formação de grupos de discussão.

Como no EAD o aluno está solitário, é indispensável que receba mais motivação do que conteúdo.

Feitas estas considerações, podemos definir estratégias adequadas à aprendizagem da produção de texto. Todas estas estratégias referem-se à construção do conhecimento. A tarefa da construção de estratégias é o aspecto central da proposta metodológica. Vejamos cada uma delas:

a) Individualização da Instrução – O ensino a distância tem que responder às peculiaridades de cada aluno. O projeto deve ser pensado de forma flexível a fim de corresponder às expectativas dos alunos. A generalização e os conteúdos estratificados não contribuem para que o estudante se sinta o centro do processo. O aluno deve ter o controle de seu progresso e respostas ao esforço realizado. Por este motivo toda a tarefa de aprendizagem deve ser antecedida por atividades de sondagem e seguida por outras de avaliação. A aquisição de conhecimento é meio do processo de aprendizagem e não o seu fim. Ao contrário do que pensam alguns, EAD exige dos tutores uma qualificação especializada e uma sólida formação profissional, pois a cada instante é exigida uma ação. O tutor, também, deve ser um sujeito que esteja constantemente avaliando e incrementando o processo.

b) Avaliação contínua - Quando são propostas atividade pré e pós cada aprendizagem, o aluno se capacita a avaliar o seu desempenho e, com isto, motiva-se para a progressão nos estudos. Os conteúdos devem estar fracionados em unidades menores, para que o aluno possa perceber o seu progresso a cada instante. Procedendo desta forma, a aprendizagem torna-se um processo contínuo.

No ambiente tradicional de sala de aula, os alunos são submetidos a processos de avaliação determinados por períodos de tempo, provas mensais, bimestrais, semestrais, entre outras. No caso do EAD, isto não faz sentido, pois o tempo histórico ficou abolido, e, em seu lugar, estabelece-se o tempo do ritmo de aprendizagem do aluno. Não há dúvidas de que o tutor deve estar permanentemente em vigilância para que o aluno possa conferir seus resultados, bem como solicitar novos testes. Não se pode relegar a avaliação a meras baterias de testes ao final de curso, em ocasiões especiais, ela deve ser contínua, mesmo que sem caráter de promoção.

Em termos de EAD temos de estar atentos para algumas questões de confiabilidade em relação ao processo de avaliação. O meio eletrônico é, com certeza, um aliado fundamental em termos metodológicos, mas deixa muito a desejar quanto à credibilidade de resultados de avaliação.  Por tal razão, podemos entender que todas as atividades podem, e devem, ser desenvolvidas de forma que possibilitem ao aluno exercitar a sua capacidade de produção de texto via meio eletrônico, mas a avaliação, como conferência de resultados, deve estar restrita às atividades presenciais.

O uso da Internet, por si só, não credita lisura às tarefas discentes e, portanto, cabe ao administrador dos recursos eletrônicos prever atividades que elevem o grau de segurança e confiabilidade para que o processo de Ensino a Distância (EAD) ganhe em credibilidade e funcionalidade.

c) Disponibilidade de material de leitura.  Seria ridículo imaginar um projeto de produção de texto a partir de um conjunto finito de leituras. O aluno deve ter à sua disposição um conjunto aberto de textos, formado tanto pela seleção do tutor, como por indicações de componentes da comunidade virtual. Neste sentido, mais uma vez destaca-se a importância do tutor como o agente capaz de selecionar e classificar todas as contribuições oferecidas pelos alunos. É da diversidade do material que depende a originalidade dos argumentos, bem como a motivação para as discussões.

Se a biblioteca disponível for composta por um conjunto fechado de textos, o aluno entende que o seu esforço está limitado ao consumo do material ofertado, quando o ideal é que ele perceba que o seu trabalho não tem limites e o seu aprendizado é fruto de um esforço contínuo e pessoal.

O material selecionado não pode estar ordenado por um posicionamento único, ele tem que privilegiar o contraditório e ofertar pontos de vista muitas vezes conflitantes para que o aluno possa tomar posição e firmar suas convicções. O papel do tutor é muito mais o de um guia de leituras do que o de um fornecedor de textos e argumentos.

d) Formação de uma comunidade virtual – A escola deve ter uma visão que ultrapasse os seus muros. A comunidade deve ser formada, principalmente pelos alunos da classe, mas não pode deixar de incluir pessoas que queiram participar e contribuir com textos e discussões.  Não há dúvida de que, em termos formais de avaliação e promoção, a comunidade deve distinguir dentre os seus membros aqueles que participam da classe e aqueles que se agregam às tarefas como colaboradores. Através de e-mail, fórum e lista de discussão, a comunidade pode se ampliar e assim se tornar mais dinâmica e motivada. O controle do crescimento da comunidade, bem como de seu aproveitamento deve ser uma preocupação constante do tutor.

e) Descontextualização – Ao acompanharmos a evolução dos processos de comunicação, podemos perceber que as culturas orais têm os atores da comunicação presentes, o que significa que o contexto é o mesmo. Com a invenção da escrita, o contexto já não acompanha mais o ato comunicativo, havendo a necessidade do destinatário reconstruí-lo. No ciberespaço, o processo de descontextualização é muito maior, pois já não estão presentes as dimensões de tempo e espaço. O contexto da comunicação torna-se cada vez menos presente à medida que elementos tecnológicos se interpõem entre falante/ouvinte.

Este processo de descontextualização corresponde a uma universalização maior, o que significa cada vez mais um discurso desprovido de marcas de individualidade. Neste sentido é importante que o tutor esteja atento para a ocorrência deste fenômeno que deve ser controlado.  O tutor deve ter presente que o aluno passa a lidar com um processo de produção de texto que está, em certos casos, bem mais distante de sua subjetividade. Recuperar, pelo menos em parte, a contextualização do discurso é uma tarefa importante por parte do tutor.

Em relação ao contexto, Pierre Lévy observa:

(...) é difícil compreender uma mensagem fora de seu contexto vivo de produção. É este motivo pelo qual, do lado da recepção, foram inventadas as artes da interpretação, da tradução, toda uma tecnologia lingüística. Do lado da emissão, foi feito um esforço para compor mensagens que pudessem circular em toda parte, independentemente de suas condições de produção, e que, na medida do possível, contêm em si mesmas suas chaves de interpretação, ou sua razão. (LÉVY: 1999, p. 114)

A aprendizagem da produção de texto é um processo lento e gradual que deve ser sistematizado pelo tutor de forma que o aluno possa acompanhar cada passo, medindo seu progresso e desejando avançar nos conteúdos. Serafini (1991, p. 152) aponta seis abordagens para o ensino da redação. Para o presente trabalho, vamos nos concentrar em abordagens que consideramos mais apropriadas para o ambiente de EAD.

a)      Abordagem como processo. Nesta modalidade o tutor deve centrar seu esforço no sentido de definir, com clareza, etapas que vão da leitura à escrita, passando pela compreensão da estrutura do texto e sua interpretação. Ao encarar a aprendizagem da escrita como processo, o tutor deve percorrer os seguintes passos.

·        Seleção de texto gerador que permita a discussão de termos interessantes, polêmicos, para que o aluno se engaje na tarefa de ler e refletir.

·        Exame da estrutura do texto, definindo tipologia e recursos estilísticos e lingüísticos adequados.

·        Elaboração de esquemas e gráficos que visualizem as etapas da produção de texto.

·        Produção do texto e revisão.

 

b)      Abordagem conversacional. Esta é uma modalidade facilmente adaptável ao ambiente de EAD, dada a ênfase na discussão entre tutor e aluno sobre temas propostos. Cabe ao tutor prever oportunidades de o aluno se manifestar bem como abrir espaço para a exposição de seus pontos de vista. Esta modalidade pode permitir o trabalho de redação em duas etapas. No primeiro, o aluno expõe seus pontos de vista através de fórum, ou mesmo de e-mail. Na segunda, o aluno, de posse de todo o material produzido até então, redige o seu texto. Ao enfrentar a produção da escrita como uma postura conversacional, o tutor deve prever os seguintes passos:

·        Lançar temas desafiadores e que possam gerar polêmica. O aluno deve ser desafiado a pensar sobre o assunto a fim de amadurecer o seu ponto de vista.

·        Manter o foco da discussão nos grupos através do fórum, apesar das diferenças de posicionamentos.

·        Administrar as discussões e controlar o seu andamento, não permitindo que elas se tornem sem interesse ou que, pelo lado oposto, não se aprofundem os pontos de vista a ponto de criar antagonismos.

Estas duas abordagens são suficientes para se exemplificar as peculiaridades da metodologia de produção de texto em ambiente de EAD.

O procedimento de avaliação no ambiente de EAD se reveste de características muito importantes e peculiares. Para uma conceituação geral de avaliação, podemos tomar o conceito expresso por Serafini: 

A avaliação é o julgamento que o professor dá ao texto, através de uma nota ou de um comentário verbal, com o objetivo de quantificar seu resultado em relação ao dos demais alunos e aos resultados anteriores do próprio aluno. (SERAFINI: 1991, p. 97).

Segundo a autora, a avaliação deve ser caracterizada pelos seguintes aspectos:

·        levar em conta as diversas fases de desenvolvimento das capacidades do aluno;

·        ater-se aos objetivos do texto;

·        levar em conta o gênero textual;

·        estar relacionada ao tipo de estímulo dado à escrita.

As questões fundamentais de avaliação que valem para o ensino tradicional devem ser aqui também respeitadas, mas outros aspectos são peculiares ao ensino a distância, como a questão que se refere à confiabilidade, como já se discutiu anteriormente.

A autoria do texto é um fator que exige muita atenção do tutor, pois o aluno fica exposto a uma gama muito grande de fontes de informação, o que significa que muitas estruturas lingüísticas surgem no seu texto como remanescentes da leitura, ou mesmo camufladas através de paráfrases. A adesão do aluno à proposta do tutor deve ser considerada em termos de avaliação, pois o desvio da ordem da redação é elemento seguro de falta de originalidade.

Avaliar o texto pela sua estrutura e não apenas pelo conteúdo exposto é um fator importante de avaliação. O aluno, no EAD, está em contato com muitos posicionamentos, o que significa que muitos pontos de vista, às vezes, são contraditórios. Cabe ao aluno produzir um texto que estabeleça a coerência entre os argumentos dando-lhes uma ordenação original. Torna-se muito importante a capacidade do aluno quanto à seleção e combinação dos argumentos. No ensino tradicional, o aluno está mais próximo da subjetividade em termos argumentativos, enquanto que, no meio eletrônico, ele se aproxima muito mais da universalidade. Medir o grau de retorno argumentativo ao posicionamento pessoal do aluno é um dos fatores mais importantes em termos de avaliação de produção de texto em EAD.

O controle sobre o gênero textual trabalhado é importante também, pois cabe ao tutor fazer propostas sobre gêneros que nem sempre estão disponíveis na rede. Mais uma vez aqui é importante ter presente a questão dos universais, como conceitua Pierre Lévi na obra Cibercultura. A Internet está repleta de textos impessoais, redigidos de um ponto de vista objetivo, centrados na linguagem referencial. A troca destes parâmetros textuais possibilita ao tutor um controle sobre a produção de texto.

Levando em consideração estes fatores, é importante estabelecer os critérios que regem a avaliação do texto, mantendo as exigências quanto à coesão e coerência, bem como a elementos tradicionais como grafia, formatação e outros.

A avaliação é sempre o problema central em termos de educação e, no ambiente de EAD, ela se torna bem mais complexa. Temos dificuldade de observar a progressão do aluno, pois estamos privados do convívio em classe que, em muitos casos, é capaz de revelar dificuldades e habilidades deste aluno. Para um trabalho sério em produção de texto através do ensino a distância, é indispensável que o tutor seja um profissional com larga experiência, o que o capacita a perceber todas as peculiaridades de cada aluno.

 

 

PROPOSTA DE ATIVIDADE

 

A proposta a seguir é uma oportunidade de por em prática os pressupostos teóricos desenvolvidos até o presente. Não tem caráter de avaliação como registro de progressão, mas sim como acompanhamento, estabelecendo metas para novas propostas. O público alvo são alunos de Ensino Médio, num contexto de ensino de Produção de Texto argumentativo. Tomamos como referência uma turma de alunos de uma classe tradicional, para desenvolver o presente projeto como atividade extraclasse.

Todo o trabalho dos acadêmicos foi acompanhado pelos coordenadores pedagógicos das escolas e pelo professor da disciplina de Produção Textual da Universidade.

Dentro do ambiente de EAD, o aluno deve dispor de recursos que sustentem a presente proposta, como lista de discussões entre os colegas e acesso à biblioteca virtual, considerando-se estes como mínimos e razoáveis para um trabalho bem sucedido. O aluno pode dispor dos recursos materiais tanto em casa, como no laboratório de informática da escola.

A nossa proposta se organiza através dos seguintes passos.

Como primeiro passo, o tutor deve escolher um tema e armazenar na biblioteca diversos textos sobre o tema proposto, bem como incentivar os alunos para que busquem na rede outros textos que possam complementar o assunto e com ele estabeleçam conexão.

A capacidade de escrita é uma habilidade que o aluno adquire ao longo de sua formação e está ligada à experiência pessoal. Por tais razões, percebe-se que qualquer atividade de escrita envolve o aluno em todas as suas dimensões: comunicacional, emocional, intelectual e muitas outras.

Na formação do acervo de textos, o aluno tem a oportunidade de contribuir com textos que se tornaram importantes para ele, após algumas leituras. Este é um procedimento que individualiza o processo e dá oportunidade de interação com o grupo. O professor deve manter um registro dos textos que foram contribuição dos alunos.

Na segunda etapa, o professor deve redigir um hipertexto que direcione a atenção do aluno para a leitura e o lazer. Para tanto, o hipertexto deve estar ancorado em uma estrutura que permita uma leitura não linear, mas repleta de opções pessoais. Em termos de leituras teóricas, o aluno deve ser levado a textos que o auxiliem na descoberta de conceitos teóricos aplicáveis às atividades propostas. Em termos de lazer, o hipertexto deve explorar tanto as questões de intertextualidade, como as de variação de códigos. Assim o hipertexto deve estar abrindo caminhos para campos como música e artes plásticas, o que conquista a atenção do aluno pela visão e audição. Cabe ao professor disponibilizar o hipertexto e acompanhar o percurso de cada aluno pelos caminhos propostos.

O terceiro passo é um dos mais importantes, pois consiste em socializar a informação obtida através das leituras de cada um.  Ao circularem as informações, deve-se também estimular a reflexão, cabendo ao tutor detectar as teses mais importantes e estimular a tomada de posição.

O quarto passo consiste na organização do material recolhido e na montagem uma rede de textos (hipertexto) que expresse a opinião do aluno. Dentre todas as informações a que o aluno teve acesso ele deve selecionar aquelas que melhor expressam o seu ponto de vista e que, portanto, contribuam para a sua argumentação.

A escritura do texto principal é o passo seguinte. O texto escrito pelo aluno deve ser simples e denso de informações para que possibilite estabelecer diversos links para novos textos que reforcem a argumentação. Ao redigir o seu texto, o aluno já deve ter presentes as informações que estarão no texto base e aquelas que serão agregadas como links para formar o novo hipertexto.

Num sexto passo, cabe ao aluno selecionar elementos ilustrativos do texto, para que se complete a tarefa. Agora podemos dizer que o aluno tem um texto pessoal, gerador, interligado a diversos outros que servem de argumentação. Abrir-se para a paratextualidade é uma proposta atraente e fecunda para a participação do aluno. Além dos elementos tradicionais da paratextualidade, como ilustração, capa e epígrafes, o aluno pode também redigir textos de referência para leituras o que contribui muito para a originalidade da sua atividade.

Como sétimo passo, o aluno deve disponibilizar o seu trabalho para os demais colegas que poderão interagir através de formulários ou e-mails, expressando a opinião e acrescentando sugestões. Esta é a culminância do trabalho e se transforma num poderoso instrumento de socialização. O professor, de posse de todos os textos dos alunos, pode redigir um novo hipertexto que agregue toda a produção da classe.

Por fim, podemos falar numa etapa de avaliação que inclua tanto uma auto-avaliação do aluno, descrevendo o seu percurso de trabalho, como uma avaliação formal por parte do professor, sem impossibilitar a manifestação do grupo, exprimindo seus valores e critérios. A avaliação coletiva não pode ser esquecida nesta última etapa.

 

 

CONCLUSÃO

 

A construção do conhecimento do processo da escrita, dentro de um ambiente de EAD, exige metodologia adequada, centrada no processo de individualização do educando, ao mesmo tempo em que o integra numa comunidade de aprendizagem.

O papel do professor se amplia tanto em formação profissional, como em compromisso com o aluno, na medida em que se torna uma fonte provedora de desafios e questionamentos. O tutor, num ambiente de EAD, deve ser um profissional de comprovada capacitação, pois dele é exigido muito mais do que de um professor dentro de uma sala de aula tradicional.

O deslocamento do aluno do papel de receptor de conteúdos para construtor do próprio conhecimento compromete-o, torna-o agente atuante no mundo do conhecimento, dando-lhe autonomia para continuar sua trajetória rumo à capacitação pessoal.

Vivemos numa sociedade que já não se pauta pelas leis da era industrial, já convivemos com novos valores, o que significa que novas formas de aquisição de conhecimento regem a educação. A ilustração pessoal cede lugar a uma cultura universalizada e, portanto, o conhecimento não está mais restrito a um tempo e a um espaço, mas difuso pelo ciberespaço, acessível a todos, mas, ao mesmo tempo, invisível aos que se negam a pertencer a esta nova cultura.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

1.       BELLEI, Sérgio Luiz Prado. O livro, a literatura e o computador. São Paulo: EDUC; Florianópolis, SC: UFSC, 2002.

2.       BRAGA, Clarissa e PINHO, Lídia. Ivo viu a uva via Internet. Disponível em: http://www.facom.ufba.br/hipertexto/educa.html - Acesso em 15/10/2005.

3.       FERRÉ, Joan. Vídeo e educação. Porto Alegre: Artes Médicas. 1996.

4.       LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1966

5.       LÉVY, Pierre. O que é virtual. São Paulo: Ed. 34, 1966.

6.       PRESTERA, Gustavo E. e MOLLER, Leslie A. Facilitando a aprendizagem assíncrona à distância. Tradução de Isabella de Bem. Disponível em http://www.mtsu.edu/~itconf/proceed01/3.pdf - Acesso em 20/05/2005.

7.       SANTOS, Eloina de Fátima Gomes et alii. Ambiente educacional rico em tecnologia: a busca do sentido. Disponível em http://www.abed.org.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?UserActiveTemplate=4abed&infoid=187&sid=102&tpl=printerview – Acesso em 20/10/2005.

8.       SERAFINI, Maria Tereza. Como escrever textos. 4   ed. São Paulo: Globo, 1991.

9.       TOFFLER, Alvin. A terceira onda. Rio de Janeiro: Record. 1980.



[1] Para a conceituação de termos como virtual/virtualização, real/realização/atual/atualização, recomendamos Levy: l996.