A INTERFACE ENTRE OS CONHECIMENTOS IMPLÍCITO E EXPLÍCITO: UM ESTUDO BASEADO NO SE – OPERADOR ASPECTUAL COMO DELIMITADOR EM ESPANHOL[1]

 

Elena ORTIZ PREUSS [2]

 

 

RESUMEN: El presente artículo, oriundo de la disertación de maestría con el mismo título, enfoca la influencia del aspecto verbal en el contexto de enseñanza-aprendizaje de lenguas, evidenciando que mismo lenguas con sistemas lingüísticos semejantes, como es el caso del portugués y del español, presentan distinciones aspectuales que pueden interferir en el éxito del aprendizaje, y además de eso, muchas veces, el alumno solo no consigue percibir tales distinciones.

 

RESUMO: O presente artigo, oriundo da dissertação de mestrado com o mesmo título, enfoca a influência do aspecto verbal no contexto de ensino-aprendizagem de línguas, evidenciando que mesmo línguas com sistemas lingüísticos semelhantes, como é o caso do português e do espanhol, apresentam distinções aspectuais que podem interferir no sucesso da aprendizagem e, além disso, muitas vezes, o aluno sozinho não consegue perceber tais distinções.

 

Palabras clave: aspecto verbal; instrucción explícita.

 

Palavras-Chave: aspecto verbal; instrução explícita.

 

 

Introdução

 

Este artigo apresenta um recorte da dissertação de mestrado (com mesmo nome), e visa a expor a influência do aspecto verbal na aprendizagem de uma LE, neste caso, o espanhol. Tendo em vista o tratamento insignificante que recebe nos ambientes de ensino de LE, o estudo procura evidenciar que o sistema lingüístico do espanhol apresenta distinções aspectuais, em relação ao português, que merecem ser observadas pelo professor, pois interferem no sucesso da aprendizagem da LE.

A discussão foi planejada da seguinte maneira: primeiramente será feita uma breve exposição sobre a teoria aspectual, enfatizando os pronomes átonos como delimitadores; em segundo lugar, serão descritos os procedimentos metodológicos adotados; em terceiro lugar, serão expostos os dados relacionados ao aspecto, obtidos na coleta para a dissertação; e, finalmente serão apresentadas as conclusões.

 

2. O ASPECTO VERBAL

 

A palavra ‘aspecto’ se refere ao conjunto de informações relacionadas ao evento descrito pelo predicado, que expressa a maneira através da qual esse evento se desenvolve e se distribui no tempo, evidenciando se está delimitado ou não. O aspecto é uma categoria verbal que se relaciona ao tempo semântico, pois se refere à forma de descrever os eventos. Entretanto, existe uma diferença de significado essencial entre essas duas categorias: enquanto o tempo semântico possui uma característica dêitica, isto é, relaciona-se ao momento da enunciação de um evento – um evento pode estar localizado no passado, presente ou futuro em relação ao momento da enunciação –, o aspecto não é dêitico, já que a sua referência de tempo está relacionada aos estágios internos de realização e/ou à duração interna do evento descrito (cf. Miguel, 1999; Finger, 2000; Travaglia, 1981; dentre outros).

 

2.1. TIPOS DE ASPECTO

 

Normalmente, os estudiosos dividem o aspecto verbal em dois tipos: gramatical e lexical ou Aktionsart. O que diferencia esses dois tipos é que o primeiro refere-se à constituição interna de uma ação e é expresso através da morfologia verbal, enquanto o segundo refere-se ao predicado e suas categorias semânticas intrínsecas, tais como delimitação, telicidade, duração, dinamicidade, etc.

O aspecto gramatical apresenta, na literatura específica, várias classificações. Será exposta a seguir a teoria de Comrie (1976), que define o aspecto da seguinte forma: “aspectos são as diferentes formas de ver a constituição temporal interna de uma situação” (Comrie, 1976, p.3). O autor afirma que essas diferentes formas de ver as situações caracterizam o aspecto como perfectivo ou imperfectivo, este último podendo apresentar algumas sub-divisões em algumas línguas.

Além da informação que as distintas formas verbais apresentam sobre se uma situação está acabada ou não (cuja origem remonta aos estóicos), existe, ainda, outra informação relacionada com a maneira de ver as situações. Essa segunda informação, em conexão direta com a primeira, é dada pelo lexema verbal (classe verbal formulada por Aristóteles) e é denominada de Aktionsart ou aspecto lexical.

 

2.1.1. O ASPECTO LEXICAL OU AKTIONSART

 

A autoria da classificação dos diferentes tipos de verbos, considerando o aspecto lexical, remonta a Aristóteles, quem destacou a existência de verbos denotativos de eventos que chegaram a um ponto final – Kinesis – (por exemplo, construir) e verbos denotativos de eventos que carecem desse ponto final – Energeia (por exemplo, ver).

A partir da visão aristotélica da classificação verbal em termos de eventos terminativos ou não terminativos, Kenny (1963, apud Miguel, 1992, p. 29), reelaborou as classes de verbos e classificou-os em estados (existir, ou saber), atividades (eventos sem um ponto final como llorar e sonreír) e performances (eventos que possuem um ponto final como construir ou pintar).Um dos mais conhecidos pesquisadores a tratar do aspecto lexical foi Vendler (1967), que subdividiu os verbos de performances propostos por Kenny em verbos de processo culminado (accomplishments) e de culminação (achievements). Vendler (1967) apresentou, em sua análise do aspecto, uma proposta com as seguintes categorias semânticas: verbos de estado, de atividade ou processo, de processo culminado (accomplishments) e de culminação (achievements).

Segundo Vendler (op.cit), os verbos de estado descrevem eventos ou situações que não possuem dinâmica interna nem duração definida, como, por exemplo, estar doente, conhecer, amar, etc., enquanto os verbos de atividade ou processo descrevem processos dinâmicos e possuem um ponto final arbitrário e se referem a eventos que envolvem algum tipo de atividade física ou mental. Sua culminância não é intrínseca ao verbo e ação em si, ou seja, descrevem situações que têm a possibilidade de voltar e seguir ocorrendo, pois a atividade não termina, mas sim pára ou interrompe-se, como, por exemplo, viajar, nadar, falar, etc.

Por outro lado, os verbos de processo culminado descrevem situações que possuem duração intrínseca, com estágios sucessivos e um ponto de culminância, que representa o fim do processo, como, por exemplo, construir uma casa, ler um livro, beber um copo de água, etc., ao passo que os verbos de culminação descrevem eventos instantâneos e que não possuem estágios internos, tais como nascer, chegar em casa, abrir a porta, etc. A diferença entre os verbos de processo culminado e os de culminação é que os últimos se referem ao desfecho da ação enquanto aqueles se referem ao processo inteiro.

 

2.2. o SE operador aspectual

 

A proposta de Fernández Lagunilla & Miguel (2000a) sustenta-se na premissa de que o SE (e suas formas pessoais) é um operador aspectual que indica que o evento culmina num ponto que desemboca em uma mudança de estado. O Se com valor aspectual é um clítico culminativo, cujo uso não é obrigatório, porém a sua presença exige um contexto lingüístico específico. Para melhor ilustrar o contexto de uso do SE delimitador em espanhol, tomaram-se por base os exemplos usados por Miguel (1999), citados abaixo em (1, 2 e 3):

 

(1) a) Sara se ha fumado *(un puro) hace una hora.

            Sara fumou um cigarro faz uma hora.

 

(2) a) Esa actriz (*se) fuma {puros/mucho}

            Essa atriz fuma {cigarros/ muito}

 

(3) a) Sara (se) ha fumado un puro.

                        Sara fumou um cigarro.

 

O exemplo (1), que contém a partícula se, só é aceitável mediante o uso do complemento direto un puro. No exemplo (2), entretanto, o evento não está delimitado, fazendo com que a presença do se não seja possível, ao passo que no exemplo (3) a presença da partícula se é permitida, pois o evento está delimitado pelo complemento un puro.

O se com papel delimitador associa-se a verbos transitivos, quando esses têm a possibilidade de indicar sua delimitação. Além disso, ele é opcional, no sentido de que aparece somente para destacar que o evento alcançou o seu limite, fato que já estaria indicado sem a sua presença.

O se pode também associar-se a verbos inacusativos (caer, ir, salir); porém, nesses casos, o predicado configurado será outro, isto é, a delimitação do evento fica implícita ao significado verbal e há também uma delimitação do início do evento, como nos exemplos em (4) e (5):

 

(4) a) El plato se cayó al suelo.

            O prato caiu no chão.

 

(5) a) El vaso se cayó de mis manos.

           O copo caiu das minhas mãos.

 

No exemplo (4) existe a delimitação expressa por al suelo, o que justifica a presença do se, mas no exemplo (5) o se também é compreensível, pois já está intrínseca ao significado do verbo a sua delimitação; isto é, ninguém cai e segue caindo a mesma queda.

Em suma, o SE delimitador é um operador aspectual que aparece em contextos delimitados, junto a verbos transitivos, cujo complemento apresenta a delimitação da ação verbal, ou verbos inacusativos, cuja delimitação se refere ao início do evento e está implícita ao significado verbal.

 

3. Metodologia

 

3.1. PARTICIPANTES

 

Fizeram parte desta pesquisa trinta e cinco alunos de um curso de Letras, sendo que vinte e cinco deles freqüentavam o quarto semestre e os outros dez freqüentavam o sexto semestre. Os participantes realizaram um teste que os classificou em termos de nível de proficiência (básico e intermediário), havendo assim quatro grupos - BCI – Básico Com Instrução: onze aprendizes (alunos do quarto semestre); ICI – Intermediário Com Instrução: catorze aprendizes (alunos do quarto semestre); BSI – Básico Sem Instrução: três aprendizes (alunos do sexto semestre); ISI – Intermediário Sem Instrução: sete aprendizes (alunos do sexto semestre)-, sendo que somente os sujeitos que faziam parte dos grupos BCI e ICI, considerados grupos experimentais, receberam instrução sobre os pronomes operadores aspectuais.

Os sujeitos realizaram duas etapas de testes que abrangeram tarefas de compreensão (incluindo justificativas de respostas) e produção.

 

3.2. PROCEDIMENTOS DE COLETA DOS DADOS

 

            A coleta dos dados foi feita da seguinte maneira: inicialmente foi aplicado o teste de proficiência. Na semana seguinte, foi aplicado o pré-teste. Na semana subseqüente, foi iniciada a instrução formal sobre o SE delimitador (somente para o grupo experimental), que durou duas semanas. Posteriormente, foi aplicado o pós-teste, para verificar a eficácia da instrução. Após a coleta, os dados foram sistematizados e submetidos a análises estatísticas, para, então, serem interpretados.

 

4. Descrição e Análise dos dados

 

            Visando a compreender melhor os resultados, os dados foram analisados quantitativamente e qualitativamente separando-se compreensão, produção e justificativas.

 

4.1. DADOS RELATIVOS ÀS TAREFAS DE COMPREENSÃO

 

Tabela 1- Dados gerais da compreensão das estruturas-alvo

 

 

GRUPOS

PRÉ-TESTE

(16 Questões-alvo)

PÓS-TESTE

(16 Questões-alvo)

Média

%

Desvio Padrão

Média

%

Desvio Padrão

BCI

6,45

40,34

1,75

7

43,75

2,14

BSI

6,33

39,58

0,57

8

50

1

ICI

7,57

47,32

1,34

7,85

49,10

3,03

ISI

7,42

46,42

0,78

7,57

47,32

0,53

 

Como aparece na Tabela 1, houve um aumento no número total de acertos nas questões de compreensão, no pós-teste, em todos os grupos testados, embora, curiosamente, somente o BSI tenha apresentado resultados estatisticamente significativos nessa comparação (t(2)=-5, p<0,05). Entretanto, ressalta-se que esses resultados não podem ser tomados como conclusivos, uma vez que, como demonstra o exemplo de questão (6) abaixo, havia nos testes uma alternativa (a letra C) que apontava a possibilidade das outras duas alternativas (A e B) estarem adequadas. Isso significa que, se o aprendiz escolhesse uma dessas outras possibilidades (A ou B), talvez ele tivesse percebido a regra, mesmo que não em sua totalidade. Essa discussão será retomada mais adiante, quando é apresentada a análise do uso de SE delimitador e o contexto sintático-semântico que ele exige.

(6) José ............... ayer.          (José morreu ontem.)

a) se murió

b) murió

c) a y b están correctas.           (resposta esperada)

Justificar:_____________________________________________________________

 

É importante destacar o aumento que houve no desvio padrão no caso dos grupos experimentais (BCI e ICI) e do BSI, pois é possível perceber alguma influência dessa instrução nos resultados dos participantes dos grupos experimentais, mas no caso do BSI, pode ter sido resultado da exposição dos aprendizes ao segundo instrumento (pós-teste) ter ocorrido uma semana – considerado pouco tempo – depois de terem realizado o pré-teste, o que pode ter influenciado no grau de atenção dos alunos ao realizarem o segundo teste.

Entretanto, verificou-se que no grupo BSI um dos participantes apresentou justificativas contendo como explicação o caráter aspectual do SE, o que também ocorreu com um participante do ISI. Em vista disso, é possível supor que, devido às alterações das datas de aplicação dos testes nos grupos que não receberam a instrução formal, esses participantes podem ter conversado sobre o papel do SE delimitador com os participantes que receberam a instrução e, com isso, puderam aumentar o seu número de acertos no pós-teste.

 

4.1.1. CONTEXTO QUE PROÍBE O USO DO SE DELIMITADOR

 

Tabela 2: Dados do pré e pós-teste, considerando o número total de respostas em cada uma das alternativas (16 Questões-alvo)

Pré-teste

 

GRUPOS

A

B

C

Média

%

Desvio

Padrão

Média

%

Desvio

Padrão

Média

%

Desvio

Padrão

BCI

1,90

23,86

1,22

5,72

71,59

1,27

0,27

3,40

0,46

BSI

1,33

16,66

0,57

5,66

70,83

0,57

1,00

12,5

1,00

ICI

0,85

10,71

0,66

6,5

81,25

1,16

0,64

8,03

1,00

ISI

1,14

14,29

0,69

6

75

0,81

0,85

10,71

0,89

Pós-teste

 

GRUPOS

A

B

C

Média

%

Desvio

Padrão

Média

%

Desvio

Padrão

Média

%

Desvio

Padrão

BCI

1,81

22,72

1,47

5,63

70,45

1,28

0,54

6,81

1,03

BSI

0,66

8,33

0,57

7,33

91,66

0,57

0

0

0

ICI

0,85

10,71

1,02

5,35

66,96

1,64

1,78

22,32

1,36

ISI

0,28

3,57

0,48

7

87,5

0,81

0,71

8,92

0,95

 

Conforme a tabela acima, o número de acertos foi alto tanto no pré- quanto no pós-teste. Isso deve-se, provavelmente, à semelhança da estrutura testada com o que ocorre na língua materna dos aprendizes, que não utiliza os pronomes átonos como indicadores da delimitação do evento.

Ao comparar o desempenho dos aprendizes nas duas etapas de teste, percebe-se que os grupos que receberam instrução, BCI e ICI, diminuíram o percentual de acertos no pós-teste, ou seja, na escolha da alternativa B (alternativa sem a presença do SE), e aumentaram a porcentagem de escolha da alternativa C (que apresentava a possibilidade de usar ou não o SE), sendo que, no caso do grupo ICI, esse resultado foi estatisticamente significativo (t(13)=-3,040,p<0,01). Por outro lado, os grupos de controle aumentaram o seu percentual de escolha na alternativa B, tendo relevância estatística os resultados do BSI (t(2)=-5,p<0,05) e do ISI (t(6)=-2,645,p<0,05). A partir disso, é possível afirmar que a instrução formal sobre o SE delimitador parece ter exercido uma influência negativa no desempenho dos sujeitos do primeiro grupo (BCI e ICI), devido à generalização da regra e sua conseqüente aplicação, algumas vezes, em contexto inadequado.

 

4.1.2. CONTEXTO DE USO OPCIONAL DO SE DELIMITADOR

 

Tabela 3: Dados do pré e pós-teste, considerando o número total de respostas em cada uma das alternativas (16 Questões-alvo)

PRÉ-TESTE

 

GRUPOS

A

B

C

Média

%

Desvio

Padrão

Média

%

Desvio

Padrão

Média

%

Desvio

Padrão

BCI

1,81

21,47

1,25

5,63

69,54

1,20

0,72

9,09

1,27

BSI

1,33

16,66

0,57

6

75

1

0,66

8,33

0,57

ICI

2

25

1,17

4,85

60,71

0,66

1,14

14,28

1,29

ISI

0,57

7,14

0,53

6

75

0,57

1,42

17,85

0,97

PÓS-TESTE

 

GRUPOS

A

B

C

Média

%

Desvio

Padrão

Média

%

Desvio

Padrão

Média

%

Desvio

Padrão

BCI

2,90

35,22

2,62

3,81

47,72

2,35

1,36

17,04

1,85

BSI

0,66

8,33

0,57

6,66

83,33

1,52

0,66

8,33

1,15

ICI

3,57

44,64

2,92

1,92

24,10

2,33

2,5

31,25

2,76

ISI

0,71

10,70

0,75

6,42

80,35

0,78

0,71

8,92

0,48

 

Antes de analisar os resultados é importante ressaltar que no contexto que possibilita o uso do SE delimitador, a alternativa mais adequada era a letra C, que representava o uso opcional desse pronome, uma vez que a alternativa A fazia uso do SE e a alternativa B não previa o uso do delimitador, como demonstra o exemplo (6) citado anteriormente. Entretanto a escolha de qualquer uma das outras alternativas (A ou B) não significa um erro do aluno, uma vez que o caráter opcional do pronome possibilita que o aprendiz opte por não usá-lo sem que, no entanto, esteja produzindo uma estrutura agramatical.

Como podemos observar na Tabela 3, a maioria dos participantes escolheu a alternativa B no pré-teste, ou seja, optaram por não usar o SE; entretanto, no pós-teste, apesar de os grupos de nível básico e o ISI terem continuado a manifestar a preferência pela alternativa B, a maioria dos participantes do grupo ICI optou pelo uso do SE, escolhendo a alternativa A, que continha o pronome.

Os grupos experimentais apresentaram importantes variações nas preferências entre as alternativas. A maioria dos participantes do BCI, ainda manteve, no pós-teste, a preferência pela alternativa B, embora o percentual tenha diminuído de forma significativa estatisticamente (t(10)=2,822,p<0,05), o que, conseqüentemente, ocasionou o aumento do percentual de preferência entre as alternativas A e C. O grupo ICI, por outro lado, diminuiu significativamente o índice de preferência pela alternativa B (t(13)=4,691,p<0,001) e, no pós-teste, o maior percentual desse grupo, entre as alternativas de respostas, foi na opção A.

Quanto aos grupos que não receberam instrução, o BSI aumentou o percentual de preferência pela alternativa B no pós-teste, ao que parece, em detrimento da alternativa A, já que a alternativa C manteve o mesmo percentual, evidenciando que os aprendizes, nesse caso, preferiram não usar o SE nesse teste. O grupo ISI apresentou um aumento de percentual nas alternativas A e B, em detrimento da alternativa C, que obteve uma diminuição significativa (t(6)=2,5,p<0,05) no pós-teste, o que permite pensar que esses alunos parecem não reconhecer o uso opcional do SE delimitador.

 

4.2.  DADOS RELATIVOS ÀS TAREFAS DE PRODUÇÃO

 

Tabela 4 -Dados gerais da produção das estruturas-alvo

 

 

GRUPOS

PRÉ-TESTE

(6 Questões-alvo)

PÓS-TESTE

(6 Questões-alvo)

Média

%

Desvio Padrão

Média

%

Desvio Padrão

BCI

0,27

4,54

0,46

1,90

31,81

1,44

BSI

0,66

11,11

1,15

0

0

0

ICI

1

16,67

0,67

2,07

34,52

1,59

ISI

0,57

9,52

0,78

0,42

7,14

0,78

O uso do SE nas produções aumentou significativamente, no pós-teste, nos grupos que receberam instrução, sendo significativos os resultados de ambos BCI (t(10)=-4,219,p<0,01) e  ICI (t(13)=-2,206,p<0,05). Já os grupos sem instrução (BSI e ISI), ao contrário, tiveram percentuais menores de uso do pronome SE delimitador.

Devido ao alto percentual de acertos na produção, foi analisado o comportamento dos participantes frente aos testes e foi observado que, talvez, o grau de monitoração tenha sido maior na compreensão do que na produção, tendo em vista a necessidade de se justificar as respostas. Essa observação sobre a possibilidade de a diferença em termos de monitoramento em cada um dos testes ter influenciado no desempenho dos aprendizes sustenta-se também no fato de que, após a realização dos testes, muitos participantes manifestaram à professora-pesquisadora que se sentiam mais livres nas atividades de produção, enquanto na compreensão necessitavam mais atenção para analisar as questões e responder a elas adequadamente.

 

4.3. DADOS RELATIVOS ÀS JUSTIFICATIVAS

 

Tabela 5 – Dados gerais das justificativas nas estruturas-alvo

 

 

 

GRUPOS

PRÉ-TESTE

(16 Questões-alvo)

PÓS-TESTE

(16 Questões-alvo)

Média

%

Desvio Padrão

Média

%

Desvio Padrão

BCI

0

0

0

5,54

34,65

4,50

BSI

0

0

0

0,66

4,16

1,15

ICI

0,07

0,44

0,26

9,14

57,14

3,20

ISI

0

0

0

1,28

8,03

3,40

 

 

Na análise das justificativas dos grupos experimentais, verificou-se que, no pré-teste, somente o ICI apresentou justificativa adequada às questões-alvo, cujo índice extremamente insignificante foi de 0,44%. No pós-teste, foi possível verificar um aumento significativo da adequação das justificativas dos aprendizes dos grupos experimentais, o que pode ser tomado como uma forte evidência da influência que a instrução formal sobre o SE delimitador teve durante o processo de ensino-aprendizagem.

Os grupos de controle, no pré-teste, não apresentaram justificativa adequada nas questões-alvo. No pós-teste, esses grupos melhoraram suas justificativas. Um fato importante nesses resultados é o argumento aspectual que apareceu nas justificativas desse grupo e que deve ser muito bem analisado, pois é um assunto que não está previsto na ampla maioria dos currículos de LE. Uma provável razão para esse tipo de justificativa seria a de que aprendizes dos grupos de controle tenham recebido de aprendizes do grupo experimental alguma informação sobre o SE delimitador e, em virtude das modificações das datas de aplicação dos testes, puderam melhorar o seu número de acertos.

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A partir dos dados obtidos é possível destacar a importância de chamar a atenção dos aprendizes sobre as distinções aspectuais envolvendo sua LM e a LE. Embora os dados, na maioria dos casos, não tenham apresentado relevância estatística, eles evidenciaram que os grupos experimentais, após a instrução formal, aumentaram a preferência pelo uso do SE delimitador, inclusive nas produções. Os resultados mostraram que os participantes tornaram-se mais conscientes da existência de um pronome cujo uso é opcional. Esse fato permite corroborar a afirmação de que a intervenção pedagógica voltada ao aspecto, contribui para o desenvolvimento da competência comunicativa do aprendiz de LE.

            Entretanto, esse estudo enfrentou algumas limitações, dentre as quais merece destaque aqui o conteúdo usado na instrução explícita, uma vez que a teoria apresentou algumas inconsistências. Foi constatado que ao montar-se os instrumentos, obedecendo ao referencial teórico do SE operador aspectual como delimitador, priorizando assim a coerência interna do trabalho, houve ônus, em termos de naturalidade, em algumas sentenças, o que pode ter afetado os resultados. Um exemplo claro disso é o caso das sentenças El niño durmió tranquilo e El niño se durmió tranquilo, ambas possíveis de serem produzidas, mas, de acordo com a teoria, somente a primeira seria aceita.

            Mesmo assim, o estudo apresenta informações extremamente importantes ao ensino-aprendizagem de línguas, merecendo ser destacada a importância que aspecto verbal desempenha nesse contexto.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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MIGUEL, Elena de. El aspecto léxico. In: BOSQUE, I. ; DEMONTE, V. (Dir.) Gramática descriptiva de la Lengua Española. Volumen 2: Las construcciones sintácticas fundamentales; relaciones temporales, aspectuales y modales. Madrid: Espasa Calpe, S.A, 1999. p 2977-3060.

______. El aspecto en la sintaxis del español: perfectividad e impersonalidad. Madrid: Ediciones de la UAM, 1992.

______. El operador aspectual se. Sociedad Española de Lingüística, 30, 1, Madrid, 2000a, p.13-43.

MIOTO, Carlos, SILVA, Maria C. F., LOPES, Ruth E. V. Novo Manual de Sintaxe. Florianópolis: Insular, 2004.

MORIMOTO, Yuko. El aspecto léxico: delimitación. Madrid: Arco/Libros S.L., 1998

OLIVEIRA, Fátima. Tempo e aspecto. In: MIRA MATEUS, Maria Helena. et al. Gramática da língua portuguesa. Lisboa: Caminho, 2003. p 127-177.

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VENDLER, Z. Verbs and times. Philosophical Review, v.66, 1967. p 143-160.

 



[1] Este artigo se originou da Dissertação de Mestrado da autora, sob a orientação da prof. Drª Ingrid Finger, no Curso de Mestrado em Letras da UCPEL.

[2] Professora da Universidade Regional do Alto Uruguai e das Missões – URI, Campus de Frederico Westphalen – RS.