INTRODUÇÃO
O foco deste trabalho recai sobre construções do tipo Ser+N+(prep)INF, conforme exemplificado em (1). Pretende-se analisar sincronicamente a configuração sintática que apresentam, descrevendo seus contextos de uso e mostrando que (prep) INF ora parece comportar-se como sujeito da oração principal, ora assemelha-se a complemento nominal, processo que resulta também em usos híbridos, o que pode tornar sua interpretação ambígua – indício de um processo de mudança.
(1) Era uma dificuldade (pra) (mim) chegar na aula, né? (FLP18L123).
Os pressupostos teóricos são de cunho funcionalista, especialmente no que diz respeito à mudança via gramaticalização, entendida como um fenômeno sintático, discursivo e pragmático, a ser estudado do ponto de vista de padrões fluidos da língua em uso (cf. GIVÓN, 1995; HOPPER & TRAUGOTT, 1993; TRAUGOTT & HEINE, 1991).
Os dados analisados foram extraídos de 36 entrevistas sociolingüísticas realizadas com informantes nascidos e residentes na cidade de Florianópolis, integrantes do banco de dados do Projeto VARSUL[1]. Os informantes são estratificados de acordo com gênero/sexo, três faixas etárias (15 a 24; 25 a 49 e mais de 50 anos) e três níveis de escolaridade (até 4 anos; de 5 a 8 anos e de 9 a 11 anos). As seguintes variáveis lingüísticas foram controladas: tipo de preposição (de, pra, Ø), configuração sintática da construção, expressão do sujeito de INF, material intermediário (entre N e INF), elemento nominal da oração matriz.
Trabalhamos com as
seguintes hipóteses gerais: (i) o
estatuto sintático da oração infinitiva torna-se ambíguo à medida que a
configuração básica vai se alterando; (ii) o tipo de construção mais freqüente
deve ser o supostamente mais integrado (Ser+N+INF), conferindo uma
interpretação genérica a um enunciado avaliativo atemporal (Ex.: É fácil
fazer arroz. É bom comer)
– oração tipicamente subjetiva; (iii) trata-se de um fenômeno de
mudança em curso.
1. GRAMATICALIZAÇÃO E COMBINAÇÃO DE ORAÇÕES
Segundo
Hopper & Traugott (1993), existe um continuum de estágios: parataxe
> hipotaxe > subordinação, que reflete, hipoteticamente, um percurso
de mudança lingüística na combinação de orações, via gramaticalização.
Há uma série de parâmetros semântico-sintáticos que são utilizados para
distribuir as orações combinadas numa escala de integração. A hipótese
subjacente é que quanto mais integrada for uma construção mais
gramaticalizada ela será.
Os
parâmetros acima mencionados controlam, por exemplo, o constituinte da matriz
ao qual a oração se vincula e o nível de vinculação sintática
estabelecido; a ordem da oração marginal face a matriz; o grau de expansão/redução,
indicado pela morfologia verbal e pelo comportamento do sujeito – apagado ou
convertido em oblíquo; o grau de entrelaçamento, avaliado pelo
compartilhamento de elementos, explicitude do conector e quantidade de material
intermediário (LEHMANN, 1988). Pode-se dizer então que uma sentença complexa será tanto
mais integrada quanto mais a oração marginal apresentar os seguintes parâmetros,
entre outros: vinculação sintática a constituinte da oração matriz,
variabilidade posicional restrita, morfologia verbal nominal (forma reduzida),
sujeito não expresso e ausência de conector.
O primeiro resultado que merece destaque diz respeito à produtividade relativamente baixa dos dados analisados. Em cerca de 36 horas de gravação, foram encontradas apenas 70 ocorrências de construções do tipo Ser+N+(prep)INF. Outro registro interessante é que em 90% das ocorrências o constituinte nominal (N) corresponde a um adjetivo de natureza avaliativa (fácil/difícil; bom/ruim). Outra tendência verificada foi de que em 81% dos casos não houve material intermediário entre N e INF, a não ser a preposição e um eventual sujeito de INF expresso. Esses resultados apontam para o fato de a construção apresentar uma certa cristalização em seus constituintes. A despeito disso, há alguns indícios de que estamos diante de um fenômeno de mudança lingüística em curso. Apresentamos, a seguir, os resultados para as variáveis consideradas mais importantes.
Tínhamos por hipóteses que (i) o tipo de construção mais freqüente seria sem preposição; (ii) a presença de preposição entre N e INF (material intermediário) acarretaria um afrouxamento no grau de integração; (iii) teríamos um caso de variação lingüística, nos moldes labovianos. Vejam-se os exemplos para esse grupo de fatores:
(2)
Naquela época também era mais fácil pra se fazer, né?
Aniversário (FLPJ2L1419).
(3)
Hoje quase já não é difícil de ficar vendo (FLPJ2304).
(4)
É difícil f eu ir na igreja (FLPJ3L927).
Conforme o esperado, a incidência maior foi de construções sem preposição. Quando expressa, o uso preferencial é para a preposição de. Veja-se a tabela 1.
f Freq. % |
DE Freq. % |
PRA Freq. % |
TOTAL Freq. % |
40 57 |
20 29 |
10 14 |
70 100 |
Tabela 1: Distribuição das construções conforme o tipo de preposição
Em um pouco mais da metade dos dados analisados (57%), não há preposição expressa. Dos casos com presença de preposição, em 20 (29%) aparece de e em 10 (14%) ocorre pra. Temos, aparentemente, uma regra variável operando aqui, com possibilidade de realização na forma de três variantes distintas. Entretanto, há algumas restrições, conforme detalhamos a seguir.
Durante
a análise, observamos que há determinadas construções que parecem aceitar
somente a preposição pra, outras apenas de, e algumas aceitam
ambas as preposições. Em alguns casos a substituição entre as três formas não
traz problemas, mas há alternativas cuja realização mostrou-se duvidosa.[2]
Observem-se os exemplos:
(5)
Pra chegar até o Rita Maria a pé seria fácil.(FLPJ2L1073)
(6)
É difícil f
eu ficar em casa, né? (FLPJ2L199)
O
exemplo (5) parece não admitir o uso da preposição de (*De chegar
até o Rita Maria a pé seria fácil). Já em (6) o uso da preposição
de (É difícil de eu ficar em casa, né?) é mais facilmente
aceito do que o da preposição pra (É difícil pra eu ficar em casa,
né?). Entretanto, se o pronome de primeira pessoa aparecesse na forma tônica
(mim), o grau de aceitabilidade da construção já seria maior. Da mesma
maneira, se o verbo principal fosse estar (em vez de ser), o uso
de pra já não sofreria nenhuma restrição (Está difícil pra eu
ficar em casa, né?).
Os comentários acima evidenciam a dificuldade encontrada para avaliar as possibilidades potenciais de ocorrência das construções, pois estamos, nesse caso, nos baseando apenas em julgamentos intuitivos e não em dados efetivamente produzidos pelos informantes. Essa flexibilidade apenas relativa das construções, quanto ao uso ou não de preposição e quanto ao uso exclusivo de uma preposição em particular, impede que tratemos esse fenômeno como regra variável[3] (cf. LABOV, 1978) Por outro lado, essa falta de nitidez no comportamento de construções do tipo aqui analisado é indício de que elas estariam passando por um processo de mudança.
Considerando o parâmetro relativo ao grau de entrelaçamento que prevê uma integração mais frouxa com a presença de conector (LEHMANN, 1988), notamos que, nos dados da amostra aqui analisada, a preposição (conector) pode ser responsável por uma integração mais estreita. Observe-se:
(7)
Seria fácil (pra/de) chegar até o Rita
Maria a pé.
(8)
Pra chegar até o Rita Maria a pé seria fácil..
(9)*De
chegar até o Rita Maria a pé seria fácil.
Note-se que a anteposição da oração infinitiva com preposição só
é possível com pra. Tal ordenação provavelmente se deva à natureza
da preposição, típica de indicação de finalidade em constituintes com valor
adverbial, portanto potencialmente deslocáveis, o que favorece o rompimento da
ordem V N (prep) INF verificada em (7). Já a preposição de, prototípica
para complementos nominais, parece impedida de se deslocar e romper, assim, a
integração entre N (nome) e seu complemento.
Retomando
nossas hipóteses, verificamos que foram apenas parcialmente confirmadas: (i) o
tipo de construção mais freqüente é sem preposição; (ii) enquanto a
preposição pra entre N e INF propicia um afrouxamento no grau de
integração, a preposição de assegura um vínculo sintático mais
estreito; (iii) há restrições para que de, pra e Ø se comportam como
variantes de uma mesma variável lingüística.
Como
houve uma distribuição razoável das ocorrências em termos de presença/ ausência
de preposição, optamos por apresentar os resultados quantitativos tomando o
tipo de preposição como variável de referência.
O tipo de construção em análise apresentou-se em diferentes configurações sintáticas:
Ser+N+INF+SN:
(10)
É difícil f
ele comprar uma cerveja (FLPJ21L523)
Ser+N+INF+ADV:
(11) É difícil
f
eu ir na igreja (FLP03L927)
Ser+N+INF:
(12) Daí eu não sei, porque é difícil eu ir (FLPJ03L981).
INF
(ADV)+Ser+N: (13) Voltar pro colégio agora pra 5a
série é ruim (FLPJ23L143).
ADV+Ser+N+INF:
(14) Aqui é um lugarzinho bom de se morar (FLP15L820)
SN+Ser+N+INF:
(15)
Amigas é muito difícil f
arranjar hoje em dia, né? (FLPJ19L123)
SN+INF+Ser+N:
(16)
Dinheiro pra entrar é difícil (FLP04L810)
Em relação à ordem dos constituintes, os três primeiros exemplos constituem um bloco cuja única diferença reside na transitividade do verbo INF e a oração infinitiva pode ser facilmente analisada como subjetiva. Em (13) a oração infinitiva foi anteposta e continua mantendo o mesmo estatuto sintático. Já nas demais frases, o deslocamento dos itens lingüísticos aqui, amigas e dinheiro traz uma certa dificuldade para interpretar o estatuto sintático da oração infinitiva. Observe-se o exemplo a seguir, que apresenta a mesma configuração sintática de (15):
(16)
Oh, detetive é massa! É complicado, bem complicado de jogar
(FLPJ21L1141)
Na seqüência É complicado, bem complicado de jogar não há material intermediário entre N (complicado) – se desconsiderarmos a repetição – e o verbo no infinitivo (jogar), nem sujeito expresso de INF. A oração infinitiva parece estar funcionando como completiva nominal, portanto fortemente integrada ao núcleo nominal da oração matriz. Por outro lado, o SN detetive parece comportar-se como sujeito do verbo da oração principal (é). Em relação a isso, pode-se pensar que: (i) o SN detetive foi topicalizado, deslocando-se de sua posição original de complemento verbal de INF (jogar detetive) e passando a atuar como sujeito potencial de ser; ou (ii) que o SN detetive seja realmente sujeito do verbo de ligação, interpretando-se a construção infinitiva como sendo passiva (de ser jogado).
Tal ambigüidade aponta para o fato de que estamos diante de uma construção com estatuto sintático não definido: (i) se detetive for interpretado como objeto direto de jogar que foi topicalizado, então se pode dizer que a oração de INF (de jogar) é subjetiva, pois funcionaria como sujeito de ser; (ii), por outro lado, se detetive for interpretado como sujeito de ser, então a oração de INF seria analisada como completiva nominal (complemento de complicado). No segundo caso, teríamos uma construção sintaticamente mais integrada, funcionando inclusive na ordem canônica: SV. Veja-se a tabela:
|
Ø Freq.
% |
DE Freq.
% |
PRA Freq.
% |
TOTAL Freq.
% |
Ser
N Inf SN |
12
30 |
2
10 |
2
20 |
16
23 |
Ser
N Inf Adv |
7
17 |
1
05 |
2
20 |
10
14 |
Ser
N Inf |
8
20 |
4
20 |
0
00 |
12
17 |
Inf
(Adv) Ser N |
3
08 |
0
00 |
2
20 |
5
07 |
Adv
Ser N Inf |
8
20 |
9
45 |
3
30 |
20
29 |
SN
Ser N Inf |
2
05 |
4
20 |
0
00 |
6
09 |
SN
Inf Ser N |
0
00 |
0
00 |
1
10 |
1
01 |
TOTAL |
40
100 |
20
100 |
10
100 |
70
100 |
Tabela
2: Configuração das sentenças em relação ao tipo de preposição
As ocorrências mais interessantes para o propósito de nossa análise são as distribuídas nos três últimos fatores da tabela 2, ou seja, aquelas que apresentam deslocamento de algum constituinte da posição à direita de INF para a posição inicial da sentença. Esses casos (27 ocorrências) não correspondem ao tipo de configuração canônica subjetiva de acordo com a tradição gramatical, especialmente o que se inicia com SN. Conforme já destacado, esse tipo é o que coloca em dúvida o estatuto subjetivo de INF, uma vez que passa a haver um candidato potencial a sujeito de ser.
Quanto ao uso de preposição, nas três últimas configurações a preferência é pela preposição de (13 casos), seguida de f (10 casos) e, por último, de pra (4 casos). As demais construções (43 ocorrências) são do tipo mais tipicamente previsto como oração subjetiva pela tradição gramatical. Note-se que o tipo de construção Ser+N+INF+SN aparece preferencialmente com ausência de preposição (12 dados). Vejam-se outros exemplos com anteposição de SN:
(17)
Fórmula um hoje é difícil f
ver, né? (FLPJ2L300)
(18)
A vida em Florianópolis, realmente, era boa de viver
(FLP13L231)
(19)
Florianópolis está muito aumentada... Cresceu muito e é boa
de se viver (FLP15L354)
Em (17) a topicalização do SN torna fórmula um forte candidato a sujeito de ser. Em (18) e (19), os SNs sublinhados estão nitidamente funcionando como sujeito, marcados inclusive pela concordância nominal (boa); e a preposição de está fortemente integrada ao adjetivo precedente, caracterizando constituintes completivos nominais (e não subjetivos).
Observe-se, ainda, que a grande maioria dos dados (58 ocorrências = 83%) apresenta algum elemento (SN, Adv) após o INF ou já deslocado para a primeira posição estrutural, o que favorece deslocamentos como os exemplificados acima, afetando o estatuto sintático da oração INF.
Quanto ao uso da preposição, parecem estar funcionando como restrições ao aparecimento de pra as configurações em que INF ficou desacompanhado: SN+Ser+N+INF e Ser+N+INF. Por outro lado, a preposição de não aparece nos casos em que INF está anteposto ao verbo principal: SN+INF+Ser+N e INF+ (ADV) Ser+N.
Esses resultados confirmam nossas hipóteses de que (i) o estatuto sintático da oração infinitiva torna-se ambíguo à medida que a configuração básica vai se alterando; e (ii) o tipo de construção mais freqüente é o supostamente mais integrado (Ser+N+INF), conferindo uma interpretação genérica a um enunciado avaliativo atemporal. Essa última hipótese é respaldada pelos números dispostos na primeira coluna correspondente aos três primeiros fatores da tabela: temos 27 ocorrências na ordem considerada canônica e sem preposição.
EXPRESSÃO DO SUJEITO DE INFINITIVO
Com o controle dessa variável é possível perceber um maior ou menor grau de integração entre as orações. Observem-se os exemplos:
(20) É super difícil f subir em árvore (FLP1L99)
(21) Na aula de química é difícil alguém falar alguma coisa (FLPJ21L773)
Em (21), a presença explícita de sujeito de INF (alguém) torna essa construção menos integrada que (20). Em ambas, porém, não há nenhuma restrição sintática para a mobilidade da oração infinitiva, que é facilmente identificada como subjetiva. Considerando-se a distribuição dessa variável em relação ao tipo de preposição, temos o resultado mostrado na tabela a seguir.
|
Ø Freq.
% |
DE Freq.
% |
PRA Freq.
% |
TOTAL Freq.
% |
Ausência
|
21
52 |
14
70 |
5
50 |
40
57 |
Presença |
19
48 |
6
30 |
5
50 |
30
43 |
TOTAL |
40
100 |
20
100 |
10
100 |
70
100 |
Tabela
3: Correlação entre sujeito de INF e tipo de preposição
Como
se observa, 57% (40 ocorrências) dos dados apresentaram ausência de sujeito de
infinitivo (número equivalente à ausência de preposição). As ocorrências
de sujeito expresso (43%) distribuem-se em: SN pleno, eu, a gente, nós, tu,
você, ele(a), se. Verificamos que 52% dos dados sem preposição também não
apresentaram sujeito expresso, enquanto que 48% desses dados tinham sujeito
realizado. Prosseguindo com uma leitura vertical da tabela, verifica-se que os
dados com de concentram-se mais em construções sem sujeito de INF
(70%), como em: É fácil de f criar, contra
30% com sujeito expresso, como em: É muito mais fácil de se pegar
Aids sendo homossexual. Como já discutido anteriormente, o tipo de construção
(de f
INF) torna a oração mais
integrada devido à dificuldade de deslocamento de de INF.
No
que se refere à preposição pra, a distribuição em relação ao
sujeito de INF é equilibrada: 5 dados sem sujeito expresso e 5 com sujeito,
como em: Era difícil pra ela
dar umazinha (FLPJ23L1280).
A
freqüência maior de ocorrências concentra-se na correlação: ausência de
sujeito e de preposição (21 dados = 30% do total). Construções do tipo: É
difícil f
ter ceia estariam,
de acordo com os parâmetros de Lehmann, mais integradas, pois ausência de
preposição e de sujeito expresso seriam fatores de maior grau de integração
entre as orações núcleo e margem. Porém, percebemos que a ausência de
preposição (principalmente de) facilita o deslocamento da oração
infinitiva causando um afrouxamento entre as orações, como em: Ter ceia é
difícil. Assim, temos evidências contrárias aos parâmetros acima
mencionados, uma vez que a ausência de preposição facilitaria a mobilidade de
INF (grau menor de integração) enquanto a presença da preposição
dificultaria o deslocamento de INF (grau maior de integração). Uma construção
como: De ter ceia é difícil seria, no mínimo, estranha.
Embora o número de dados analisados seja reduzido, foram controladas as variáveis sociais idade, escolaridade e gênero do informante. Em relação à idade, verificou-se uma distribuição escalar em relação ao uso da preposição pra, tida como inovadora nos contextos analisados: jovens (19%) > 25-49 anos (16%) > + de 50 anos (6%). Em contrapartida o índice de uso da preposição de foi mais baixo nos jovens.
No que se refere à escolaridade, observou-se que informantes com grau colegial são os que menos usam de e os que mais usam pra. Já entre os informantes com baixa escolaridade verificou-se a maior incidência de ausência de preposição (70%) e um índice baixo de pra (9%).
Quanto ao gênero, não houve diferenças significativas entre homens e mulheres.
Constatamos que, apesar de a preferência ser pelas construções sem material interveniente, sem preposição (ou com a preposição de) e sem sujeito de infinitivo expresso, há um movimento no sentido de preenchimento do sujeito de INF (43%) e inserção de preposição (43%), com preferência por de (29%) mas com incidência relativamente alta de pra (14%) – construção tida como inovadora. Destacamos como resultados mais significativos:
(i) A preposição de é responsável por um grau maior de integração à medida que se comporta como um elemento que restringe a mobilidade de INF, contribuindo para que a oração infinitiva seja analisada como completiva nominal.
(ii) A preposição pra, dada a sua natureza, propicia um grau menor de integração às orações combinadas, favorecendo o deslocamento de INF e uma interpretação da oração infinitiva como sendo subjetiva.
(iii) Embora quantitativamente não relevante, a configuração sintática SN+ Ser+N+INF, com deslocamento de SN da posição de objeto de INF para a posição de sujeito de ser (seguindo uma tendência geral ao preenchimento do sujeito no PB), traz implicações de caráter sintático: a oração de INF deixa de ser analisada como subjetiva (já que o verbo principal passa a ter um sujeito que o antecede), firmando-se, na maioria dos casos, como completiva nominal. Assim, o deslocamento de um constituinte nominal para a esquerda da construção parece atribuir à mesma um grau maior de integração, preservando-se, inclusive, a ordem canônica: sujeito, verbo e complemento. Hipótese a ser verificada com um número maior de dados.
Uma palavrinha final: diante de construções como essas aqui analisadas, qual seria a melhor postura do professor de língua portuguesa? Ignorar esse tipo de dados? Considerá-los como desvios do padrão? Cremos que a saída mais interessante seja propiciar condições para que os alunos, experienciando a língua portuguesa em diferentes situações de uso, se tornem capazes de analisá-la em seu funcionamento – o que implica, naturalmente, considerar a questão da variação e da mudança lingüística.
GIVÓN,
Talmy. Functionalism and
grammar.
Amsterdan/Philadelphia: J. Benjamins, 1995.
HOPPER,
Paul & TRAUGOTT, Elizabeth. Grammaticalization. Cambridge: Cambridge
University Press, 1993.
LABOV, William. Sociolinguistic
Patterns. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1972.
LEHMANN,
Christian. Towards a typology of clause linkage. In: John HAIMAN & Sandra
THOMPSON (eds.) Clause combining in grammar and discourse.
Amsterdan/Philadelphia: J. Benjamins, 1988.
TRAUGOTT,
Elizabeth & HEINE, Bernd (eds.) Approaches to grammaticalization. Vol. 1:
focus on theoretical and methodological issues.
Amsterdan/Philadelphia: J. Benjamins 1991.
[1] Variação Lingüística Urbana na Região Sul do Brasil
[2] Submetemos os dados à avaliação de outras pessoas e, em alguns casos, não houve consenso nas avaliações.
[3] Com um número maior de dados disponíveis, seria possível redistribuir as ocorrências, considerando as restrições apontadas acima e, então, dispensar um tratamento variacionista aos dados. Essa proposta fica para trabalhos futuros.